terça-feira, 7 de janeiro de 2025

Scanlines


Todd Keisling (2020). Scanlines. Perpetual Motion Machine Publishing.

Uma belíssima surpresa, vinda das recomendações de halloween do Xataka. Esta novela curta mas muito eficaz toca na temática do suicídio, com uma viragem para o horror tecnológico. Tem também uma forte dose de nostalgia, remetendo-nos para os tempos aparentemente mais simples do final dos anos 90, onde os VHS coexistiam com a internet em dial-up. Os personagens deste conto cruel vivem assombrados por um espectro que os persegue desde esses tempos de adolescência.

No seu passado, naquele espírito de descoberta transgressiva tão típico da adolescência, os protagonistas descarregaram o vídeo errado da internet. O que esperavam ser umas imagens titilantes de meninas despidas acabou por se revelar um vídeo perturbador, onde numa conferência de imprensa um homem decide pôr termo à vida, rebentando os miolos. Se já de si a visão é traumática, a vida dos jovens vai ser irremediavelmente tocada pela assombração implacável do suicida, que lhes aparece nos ecrãs de televisão ou sobreposto sobre o rosto das pessoas com que se cruzam, numa alucinação sobrenatural com traços de interferência eletrónica.

Não há fuga possível, não há exorcismos, ou aplacar de espíritos. Todos os que vislumbram o vídeo estão condenados, só lhes resta o ir aguentando os dias até deixar de resistir e dexar-se levar pelo suicido. 

Há aqui laivos de muita coisa, especialmente da cultura proto-digital dos anos 90. Cassetes de vídeo assombradas que se transmitem via internet de descargas extremamente lentas, o retrato de uma época no limiar da explosão digital. A ideia de um vídeo assombrado que condena quem o vê é claramente reminiscente de Ringu, com recortes glitch culture de artefactos e erros onde o digital é instável. Na sua essência, o livro toca na luta contra a depressão suicida, essa guerra silenciosa que muitos travam, e alguns não conseguem vencer.