Grant Morrison, Richard Case (2016). Doom Patrol: Book One. Nova Iorque: DC Comics
Regresso a um dos melhores arcos narrativos de sempre na história dos comics, embora não dos mais conhecidos: a temporada de Grant Morrison como argumentista de Doom Patrol. Um conjunto de personagens que em si já é algo bizarro, um grupo de heróis relutantes que tem em comum o sentirem-se à margem da sociedade. Morrison pega nessa margem e explora-a até ao tutano, em aventuras surreais e absurdistas. Quão surreais? Neste primeiro livro, a coligir as histórias, o grupo de heróis que inclui uma força negativa que fundiu os corpos de um homem e mulher numa união alquímica, uma mulher capaz de manifestar centenas de personalidades múltiplas, e um homem cujo cérebro reside num corpo robótico, terão de enfrentar estranhas ameaças. Uma cidade imaginária que se manifesta e começa a recortar os espaços físicos. A terrível ameaça dos vilões da irmandade Dada, chefiada por Mr. Nobody, talvez o melhor super-vilão de sempre, que se consuma com o devorar da cidade de Paris por uma pintura, onde reside o quinto cavaleiro do apocalipse. O oposto do deus criador, o demiurgo descriador, ativado por uma seita que reside numa cidade desaparecida que se oculta em recantos esquecidos, através do rapto para leitura de um homem que nasceu com um livro naturalmente tatuado na pele. Surreal, absurdo, uma lição de história de arte (as ligações à pintura e literatura surrealista e dada são óbvias, com influências do ocultismo e pensamento hermético), e algo totalmente inesperado nos comics. Os comics nunca são um trabalho individual, e os ilustradores que acompanharam Morrison nesta aventura surreal conseguiram materializar a visão inesperada do argumentista.
Grant Morrison, Richard Case (2016). Doom Patrol: Book Two. Nova Iorque: DC Comics
Continuando o mergulho naquele que talvez seja o mais delirante comic de sempre, somos levados por Morrison a histórias verdadeiramente estranhas. A guerra civil entre alienígenas incompreensíveis mas limitados conceptualmente, por terem sido criações de um anjo pouco imaginativo que tentou criar um mundo à sua imagem e semelhança. Os engenhos de normalização que se ocultam nas caves do Pentágono, alimentados pelo rapto de indivíduos altamente criativos cuja energia é sugada para eliminar o bizarro do dia a dia. Uma infestação de sonhos eróticos, detida pelos agentes do sexo. Encerrando em grande este arco, temos o regresso de Mr. Nobody, o vilão cubista, e a ressurreição da irmandade de Dada, com um plano nefasto para capturar as energias da bicicleta de Hoffmann e libertar delírios psicadélicos pelo mundo. Pelo caminho, o insuportável paraplégico Dr. Niles Calder, lider da Doom Patrol, terá de enfrentar um violento justiceiro obcecado por dar caça a barbas com extremo prejuízo, a mutação de uma heroína capaz de manifestar múltiplas personalidades e que se deixa apaixonar pelo homem-robot, ou Rebis, a personagem união alquímica que decide ter relações sexuais consigo própria como parte da sua crisálida evolutiva. Ainda recebemos dois resultados particularmente brilhantes dos processos criativos de Morrison: dois novos personagens, Flex Mentallo, o herói dos músculos e que será protagonista de uma brilhante mini-serie, e Danny the Street, que é uma rua capaz de se manifestar em qualquer local real ou imaginário, uma rua simpática que dá abrigo a todo o tipo de almas perdidas. Ler Doom Patrol escrito por Grant Morrison, acompanhado por alguns dos mais arrojados ilustradores de comics dos anos 90, é saborear o completo detournement surreal e psicadélico da iconografia clássica dos comics.
Grant Morrison, Richard Case (2017). Doom Patrol: Book Three. Nova Iorque: DC Comics
Doom Patrol Book Three: Continuando o profundo mergulho em high weirdness, Morrison desconstrói totalmente a estética e pressupostos dos comics de super heróis, chegando até ao ponto de explodir os personagens, atrevendo-se a virá-los do avesso. Pelo meio, uma emanação incorporada em robôs nanotecnológicos ameaça trazer o apocalipse, começando por aniquilar o espírito das cidades que habitamos.