quinta-feira, 26 de abril de 2012

Foundation and Earth

Isaac Asimov (2004). Foundation and Earth. Nova Iorque: Bantam Books.

Dos livros da série Fundação que tenho vindo a ler, este, originalmente publicado em 1984, é o que me desperta uma reacção mais contraditória. Se nos leva a adensar a cosmologia do universo ficcional das obras, deixa quase totalmente de lado o vasto tabuleiro de jogo que caracteriza a série e acaba por parecer uma forma algo amarfanhada de interligar o universo de Fundação com outras vertentes da obra de Asimov.

Foundation and Earth inicia-se onde termina a obra anterior e o seu mote é o desvendar do mistério que acaba por dominar os principais personagens de Foundation's Edge: a busca pelo berço ancestral da humanidade, o planeta Terra. Não é uma demanda simples. A localização do planeta foi perdida, esquecida e deliberadamente apagada dos registos das civilizações que abarcam a galáxia. Apenas restam informações díspares em mitos e superstições, pequenos indícios que levam o triunvirato de personagens que dominou o livro anterior a uma viagem pelos locais ocultos da galáxia. Tarefa simples graças a um artifício narrativo que coloca nas suas mãos uma nave avançada com um sistema revolucionário de propulsão capaz de se deslocar numa fracção de tempo do utilizado pelas restantes naves espaciais. Artifício que funcionou bem em Foundation's Edge, mas que soa demasiado... artificial (passe a expressão) neste livro.

As aventuras acabam por se desenrolar como se o livro fosse uma daquelas incongruentes séries televisivas de FC em que em todos os episódios os heróis enfrentam novas ameaças sempre em diferentes planetas. Em busca da localização da Terra os personagens descobrem e visitam mundos ocultos na galáxia, cuja colonização data dos primórdios da expansão humana. Os mundos encontrados são metáforas patológicas do destino humano. Um encontra-se em dissolução ecológica, com a humanidade extinta e entregue a matilhas de cães. Outro é o paraíso dos solipsistas, habitado por um género humano que vive isolado em vastas propriedades, evoluiu para o hermafroditismo e preza tanto a individualidade e isolamento que recusam o contacto entre si para mais do que o estritamente necessário, e mesmo assim apenas por via remota. O terceiro mundo recorda o futuro distante de A Máquina do Tempo de Wells, com as ruínas de uma civilização avançada cobertas de musgo. O último é um paraíso arcádico na orbita de Alpha Centauri cujos habitantes não hesitam em infectar estranhos com vírus mortais para se manterem ocultos do resto da galáxia. Solipsismo, isolacionismo e decadência reforçados até ao eventual assassínio de estranhos que por acaso ou curiosidade se deparem com as costas malditas destes mundos que optaram por se isolar do resto da humanidade.

No final do périplo encontra-se o graal planetário, o berço da humanidade. É uma desilusão para o leitor, que talvez imagine que Asimov nos reserve para a sua visão de futuro longínquo uma futura Terra habitada por sábios e evoluídos humanos, anciães galácticos que debaixo dos plácidos céus azuis e rodeados dos artefactos que preservam a memória da imensa história observam os netos espalhados pela galáxia. Mas o autor não segue esse utópico caminho, mostrando-nos um planeta inacessível debaixo de radioactividade e um segredo oculto sob as crateras lunares.

É nesta revelação final que cai mais um elemento que desilude. Essencialmente Asimov tenta interligar o mundo de Fundação com outras das suas obras, particularmente as séries sobre robótica, com um novo personagem. Um robot literalmente milenar com capacidades psiónicas, que revela que tem estado a tentar influenciar a história galáctica através dos milénios e atrai os personagens do livro à Lua para desvendar o destino final da humanidade: evoluir para uma galáxia sentiente capaz de se expandir no universo e evitar possíveis invasões de civilizações extra-galácticas. É uma intrigante premissa, certamente inspiradora de épicas space operas, mas que após todo o brilhantismo de múltiplos significados, intrigas intricadas e evolução humana como um enorme jogo de xadrez que caracteriza a série Fundação este final a tentar interligar narrativas díspares soa como um corpo estranho enxertado à força.

Foundation and Earth é, dos livros da série que já li, aquele que parece mais forçado. Abandona os grandes temas deste universo ficcional e centra-se na busca de um berço ancestral da humanidade mas a demanda parece forçada, casual e demasiado dependente de artifícios narrativos. Os personagens e ambientes ficam-se pelos estereótipos, longe da fluidez imaginativa das obras anteriores e o infodump reina. Ao invés de conclusão, fica-se como um enxerto que tenta ligar diversos universos ficcionais do autor. Ou então fui eu que fiquei traumatizado com o futuro distópico do planeta Terra.