segunda-feira, 23 de abril de 2012

Alone Together

Sherry Turkle (2011). Alone Together. Nova Iorque: Basic Books

À primeira vista, este livro parece um contra-senso. Afinal, não foi Turkle a brilhante investigadora do MIT que no fascinante A Vida no Ecrã mapeou pela primeira vez a relação humana com os à época novos espaços digitais, sublinhando uma crença fervente que as possibilidades de desenvolvimento pessoal se expandiam no contacto do indivíduo com o ciberespaço? Foi esta a obra que primeiro nos alertou para novas formas de estar advindas da comunicação por meios digitais. E agora, passados cerca de vinte anos, o seu discurso parece ter-se alterado radicalmente com um profundo alerta dos perigos desumanizantes das tecnologias que abraçámos.

Alone Together é uma obra de reflexão investigativa que se alicerça nas percepções da autora e em dados obtidos em inúmeros trabalhos de campo. O que emerge é um retrato crítico da influência da percepção da tecnologia sobre a forma como os indivíduos se relacionam nos espaços reais e digitais.

O livro está dividido em duas partes. Na primeira, Turkle está na bleeding edge da investigação sobre os efeitos sociais da robótica, que começa agora a dar incipientes passos como tecnologia de consumo. Ficamos deslumbrados com os robots que aspiram casas, mas os proponentes das aplicações de robótica olham mais longe, para um futuro próximo em que a máquina seja uma companheira do ser humano.

Se há uma fímbria reduzida que procura companheirismo sexual robótico (herdeiros modernos das evas do futuro de L'Isle Adam e das Olímpias de Hoffmann) as suas principais utilizações estão no acompanhar dos elementos mais frágeis - crianças e idosos. Já existem nos mercados brinquedos robóticos e protótipos de máquinas desenhadas para confortar, e os investigadores tentam projectar robots capazes de responder às necessidades básicas. O que Turkle faz é pegar nestes mecanismos e soltá-los em lares de terceira idade e infantários. Os resultados amedrontam-na. Observa uma forte tendência dos utilizadores para animar a máquina, dotando-a de afectos e de uma centelha de vida que na verdade não tem. Considera atemorizador ver que somos capazes de projectar emoções num simulacro inanimado com mais entusiasmo do que aquele com que nos relacionamos com os indivíduos que nos rodeiam. Esta relação calorosa entre o homem e a máquina é uma constante desde que Weizenbaum descobriu o deleite que os utilizadores tinham em conversar com um chatbot que simulava inteligência.

Noutra vertente investigativa, Turkle analisa os nossos comportamentos de comunicação através de novas tecnologias, quer de redes sociais quer de uso de telemóveis. Aqui observa o inverso do que determinou ao olhar para a relação homem-robot, com um conformar do eu real às necessidades de uma persona online, o fascínio patológico com formas pobres de comunicação, por isso mesmo menos tocantes na alma, e a incapacidade de gerir as exigências da comunicação à distância em tempo real com as necessidades da presença física.

Turkle examina cuidadosamente este paradoxo de um investimento mais profundo de humanização com artefactos que simulam vida em contraste com a desumanização das relações entre indivíduos. E pergunta-se, legitimamente, se estamos a seguir o melhor caminho. Mas a sua conclusão não é uma inversão do entusiasmo com novas identidades digitais dos tempos de A Vida no Ecrã. Antes, é uma observação que está na hora de perder o deslumbramento com as tecnologias, amadurecendo no seu uso. Não advoga um regresso a tempos dourados pré-digitais, mas recorda-nos que estamos a esquecer a principal razão para comunicarmos: chegar ao outro. Ao olhar para os indícios de relacionamento entre humanos e simulacros robóticos, observa que essa necessidade se degrada quando o outro é um mecanismo programado de acordo com as nossas vontades, protegendo-nos dos choques emocionais violentos que nos fazem crescer enquanto pessoas. Daí o titulo deste livro. A solidão acompanhada, mediada pelos interfaces tecnológicos, degradadora da riqueza da identidade humana. Este é talvez o mais profundo e tocante livro que li nos últimos anos.