Pronto. Foram divulgados os resultados dos exames nacionais de 2009 e lá voltamos à parvoice anual dos rankings das escolas. No papel, os colégios privados apresentam resultados que os colocam no topo da escala de resultados. Mas antes de se pensar na excelência dos colégios ou no descalabro do ensino público, umas notas:
Será realmente significativo o resultado de um exame? É um dos mais antigos paradoxos da educação. Só se reflecte a longo prazo mas necessita de ser medida a curto prazo, daí os testes e exames. A preparação para um exame obriga a uma memorização e especialização a curto prazo que horas depois do exame passado se desavence. Quantos estudantes não mergulharam profundamente nos livros para obter um bom resultado num exame, e quantos desses estudantes depois se recordam do que memorizaram? No entanto é este o marco com que avaliamos uma pessoa, não as suas capacidades reais para agir sobre os desafios que se lhe colocam. Não quero com isto soar como um professor anti-exames. Testes e exames fazem jeito para aferir conhecimentos no momento e como forma de criar hábitos de estudo contínuo. Não são é o elemento preponderante das aprendizagens. Outro paradoxo do exame enquanto forma de valorizar a escola é que esta desde há muito é apontada como um local onde a teoria desfasada da realidade é preponderante... e depois é valorizada pela forma mais clássica de avaliar conhecimentos teóricos.
Na disputa entre escolas públicas e privadas, há factores a ter em conta. Podemos falar dos meios sociais e económicos, das motivações dos alunos e famílias, mas estes são relativos. Mérito e esforço suplantam questões de classe e riqueza. Vir de um meio socio-económico mais elevado não garante sucesso escolar, garante apenas uma maior exposição à cultura que pode influenciar o sucesso escolar. Mas há um factor que é indiscutível: as escolas privadas têm os alunos que escolhem, e as escolas públicas são obrigadas a responder a todos os tipos de alunos. Uma escola privada selecciona activamente os seus alunos, quer através dos critérios de admissão quer através das práticas lectivas. Ainda não conheci nenhuma escola privada que se especializasse em receber os alunos menos capazes. Quem não consegue ou não se aguenta regressa ao público. O ensino público, por lei e vocação, tem de responder a todas as situações. O que significa que no final do ensino básico e secundário uma escola privada lança aos exames grupos de alunos mentalizados, escolhidos e preparados até à exaustão por um sistema que utiliza os rankings como forma de publicidade. A escola pública lança um conjunto pouco homogéneo de alunos com diferentes motivações e preparações, com diferentes capacidades e cujas aprendizagens podem ter sido prejudicadas por climas instáveis na sala de aula.
Resumindo: se um pai preocupado pensar que escolher uma boa escola para o filho passa pelo ranking desta, pense novamente. A escolha da escola tem influência, mas nas relações sociais das crianças. Por si só não garante sucesso, independentemente da qualidade ou tipologia dos métodos pedagógicos. Se quer realmente que o seu filho se torne excelente, exponha-o. Mergulhe-o na cultura, disponibilize livros, estimule o questionar da realidade que o rodeia e cultura de mérito, e vai ver que o sucesso escolar vai ficar mais facilitado. E isso não depende da escola onde esteja a estudar. Até porque um dos factores que distingue as escolas públicas é um fortíssimo investimento na divulgação de cultura (com um papel preponderante das bibliotecas escolares através de esforços coerentes e organizados) para colmatar os factores culturais. O que nos leva de regresso à tipologia pouco homogénea de alunos do público versus a homogeneidade garantida de alunos do privado.
Uma nota final, mais rebelde: chateia-me este sublinhar dos exames como forma de excelência educativa. Chateia-me porque faz parecer que uma abordagem formalista e pouco inovadora, mas com resultados garantidos, seja superior a abordagens experimentais, mais complicadas de gerir e difíceis de medir a curto prazo. Na verdade, quantos de nós resolveram problemas e desafios do dia a dia profissional com respostas de exame?