quarta-feira, 12 de agosto de 2009

A Chegada dos Terrenos



Leigh Brackett (1993). A Chegada dos Terrenos. Lisboa: Livros do Brasil

Fantastic Fiction | The Coming Of The Terrans

O chato de ter satélites e robots semiautónomos às voltas por Marte é ficarmos a saber que afinal o lendário planeta não é bem como o imaginávamos. Onde gostaríamos de ver a Barsoom de Edgar Rice Burroughs ou as delicadas espiras das cidades à beira dos canais liricamente descritas por Ray Bradbury existe apenas rochas e pó vermelho. Publicado originalmente em 1967 e decididamente inscrito na tradição de Marte como local exótico de aventuras, o livro A Chegada dos Terrenos descreve um Marte fantástico, sugerindo uma amálgama de visões da áfrica selvagem e do exótico extremo oriente como inspiração para uma complexa mas decadente cultura marciana que interage com uma benevolente invasão humana, de uma espécie tecnologicamente mais avançada mas também menos milenar e tradicionalista.

O planeta Marte delineado por Brackett é um mundo semi-desértico, mantido vivo pelos canais que trazem a preciosa àgua dos pólos até às cidades e povoações, dividido em cidades-estado e clãs decadentes, que são um resquício empobrecido de milenares civilizações, cujos descendentes esqueçeram o saber tecnológico e vivem mergulhados em tradições que são pálidas recordações de uma grandiosidade passada.

O livro desenrola-se em cinco contos de imaginação solta, que constroem eficazmente um mundo fantástico. Em A Besta Preciosa de Marte, um astronauta em busca da mulher que ama mergulha no misterioso e selvagem ritual do shanga, que quase o reverte de corpo e alma até aos primórdios neandertais. Marte sem Bisha (título que soa muito mal em português) fala-nos de um cientista que ao resgatar o que aparenta ser uma criança marciana normal do que julga ser um selvagem assassínio ritual depara-se com um resquício telepático de outras raças marcianas já extintas que o pode levar à morte. O exotismo reina em Os Últimos Dias de Shandakor, onde um etnólogo terrestre descobre a quase morta cidade de Shandakor, onde as sombras e as visões parecem ter mais vida do que os seus reptilianos últimos habitantes. A Sacerdotisa Púrpura da Lua Louca mergulha um bem intencionado funcionário governamental que vem a Marte pregar o credo do progresso tecnológico nos terrificantes antigos mistérios da feitiçaria marciana. Finalmente, o livro encerra-se com A Estrada Para Sinharat, uma viagem pelos desertos marcianos em busca de um segredo milenar que poderá travar um conflito entre marcianos que se opõem a projectos que visam transformar o planeta.

Voo de imaginação ao sabor da ficção científica clássica dos anos 50, este livro é uma boa introdução à obra e sensibilidade de uma das raras mulheres escritoras dos tempos da era de ouro da ficção científica.