sábado, 3 de janeiro de 2009

O Erro de Descartes



Damásio, A. (2005). O Erro de Descartes. Mem Martins: Publicações Europa-América.
O Erro de Descartes (excerto)

A origem neurofisiológica das emoções que sentimos encontra-se no cérebro, no sistema límbico. Papez (1930) descreveu pela primeira vez o circuito das emoções no cérebro, num modelo em que as emoções tinham origem no hipocampo, sendo enviadas através do tálamo para a região interior do córtex, o que nos permite sentir as emoções. O sistema límbico envolve a amígdala, o hipocampo, o núcleo septal (tálamo), o lobo temporal e o córtex orbifrontal. Estes órgãos do cérebro são responsáveis pela reacção aos estímulos que nos permitem sentir medo, angústia, interacção social, empatia, amor, reacção de luta ou fuga (Chalabi et al, 2006).

Reagimos, muitas vezes sem de tal nos apercebermos, primeiramente com as emoções e depois com o pensamento racional. Muitas reacções que nos parecem intuitivas são respostas emocionais dadas pelo cérebro aos estímulos que recebe, através do sistema límbico. A neurofisiologia contemporânea, com acesso a técnicas de imagiologia que permitem perscrutar o interior do cérebro em funcionamento, mostra-nos, em particular no trabalho de Damásio, a importância das emoções e sentimentos na integralidade do ser humano e a estreita ligação entre o cérebro e a mente. Este cientista mostra, através das suas investigações em casos muitas vezes dramáticos, a relação íntima entre os sentimentos e a razão. Postula, através da sua hipótese de marcador somático, que os sentimentos nos ajudam a tomar decisões racionais, reduzindo as opções de decisão a níveis aceitáveis facilitando a gestão de decisões mas sublinhando a necessidade de equilíbrio em que o excesso ou ausência de marcadores somáticos são prejudiciais à tomada de decisões, influenciado as mais minuciosas rotinas do dia-a-dia.

A nossa mente não é indissociada do cérebro e do corpo. Antes, os complexos e interligados sistemas cerebrais são o que nos dá a sensação de ser, dominando os sentimentos mais íntimos e as decisões que cremos serem perfeitamente racionais.

O erro de Descartes está na tradição de pensamento que coloca a razão e mente como elementos superiores, independentes da carnalidade. O trabalho de Damásio, e as descobertas da neurociência, alicerçadas sobre técnicas não invasivas que perscrutam os recantos mais profundos do cérebro, revolucionando as nossas noções sobre o sentido de ser e a nossa humanidade.