segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Guns, Germs and Steel



Jared Diamond (2005). Guns, Germs and Steel. Londres: Vintage Books

PBS | Guns, Germs and Steel
Wikipedia | Guns, Germs and Steel

Foi com esta polémica obra que o antropólogo Jared Diamond foi catapultado para os palcos mediáticos. Guns, Germs and Steel apresenta argumentos polémicos, embora incisivos, que fazem questionar a forma como se concebe a evolução das sociedades humanas.

A questão de arranque de Guns, Germs and Steel é aparentemente simples. Como é que chegámos aonde chegámos? Porque é que a evolução das sociedades foi tão desigual? Quais são os factores que influenciam a evolução das sociedades? Quais as reais razões da predominância de algumas sociedades sobre outras? Para responder a estas questões, Diamond conta-nos aquela que é, nas suas palavras, uma história do mundo em quatrocentas páginas.

O colocar destas questões é já de si propício a polémicas. É fácil cair em radicalismos. Perguntar porque é que algumas sociedades se sobrepõem a outras abre a porta a argumentos questionáveis de hegemonia e superioridade rácica. São argumentos que Diamond evita, com perícia, encarando-os como falaciosos e mostrando uma visão orgânica das sociedades, mais baseada em tendências evolutivas do que ideias enganosas de superioridade.

Guns, Germs and Steel conta a história do mundo analisando alguns pilares comuns aos quatro continentes (aqui a antártida, por razões óbvias, não conta). Em primeiro lugar, a obra mostra-nos como evoluiu a alimentação, traçando a evolução desde a caça-recolecção dos tempos pré-históricos, mas ainda hoje praticada em partes mais remotas do mundo, até à produção agrícola e domesticação de animais. Diamond encontra aqui a primeira razão da hegemonia da sociedade ocidental, euroasiática. Em todo o planeta se encontram espécies vegetais cultiváveis e animais domesticáveis, mas a maior variedade encontrou-se no antigo crescente fértil na era crucial de passagem do nomadismo ao sedentarismo. Daí, a migração das sociedades espalhou as espécies cultiváveis e animais domesticados por todo o planeta, em diferentes fases: uma, mais natural e prolongada, ao longo dos climas euroasiáticos, e outra, mais recente, através dos esforços de colonização que ocuparam o novo mundo e a oceania. Diamond fala-nos de eixos, fundamentais na divulgação de espécies e tecnologias. Estes definem-se pela orientação dos continentes, e apresentam barreiras reais à transferência de conhecimentos e populações. Aqui, a eurásia sai a ganhar, com a sua orientação quase horizontal, que assegurou que as espécies animais e vegetais úteis à alimentação humana se espalhassem, levadas pelo incessante movimento humano, ao longo do continente. Outros continentes poderiam ter desenvolvido tão cedo como no crescente fértil a agricultura, mas tal não aconteceu por falta de diversidade de espécies e por barreiras climatéricas e naturais. A dieta das sociedades humanas é um dos factores principais de evolução: com maior abundância de alimentos, são possíveis estruturas políticas, militares e económicas que não estão ao alcance de grupos que dependem da recolecção.

Diamond aponta, entre outros exemplos, o da roda: conhecida das sociedades norte-americanas, não era utilizada para veículos. A razão prende-se com a falta de animais de tiro, capazes de fornecer força motriz para os veículos. Os animais domesticáveis autóctones da américa do norte não se prestavam para esta função. Mais a sul, nos andes, existia um animal domesticado capaz de ser adaptado para puxar veículos. No meio, as dificilmente transponíveis florestas e cordilheiras da américa central, uma barreira geográfica e climatérica.

As doenças, e a adpataçãos das sociedades humanas a estas, formam outro pilar da teoria de Diamond. Aqui, a domesticação dos animais fornece uma ligação à proliferação de doenças e desenvolvimento de resistência às mesmas.

Finalmente, a tecnologia. Todas as sociedades desenvolveram tecnologias que lhes permitiam sobreviver nos ambientes em que estão inseridas. Algumas sociedades desenvolveram tecnologias avançadas que acabaram por abandonar. Outras souberam aproveitar os conhecimentos e espalhar-se de forma hegemónica por todo o planeta. O porquê recupera os argumentos anteriores e adiciona argumentos mais humanos: as tecnologias são continuamente desenvolvidas, adaptadas e até rejeitadas pelas sociedades. Aqui a China surge como caso paradigmático: berço das maiores invenções humanas, não tirou partido delas por razões políticas e filosóficas.

Todos os continentes têm sociedades autóctones, capazes de sobreviver nos seus ambientes nativos, com tecnologias e conhecimentos próprios. O alastrar da sociedade euroasiática, dominante no planeta, deu-se após o desenvolvimento de tecnologias capazes de transferir a agricultura, animais domesticados e conhecimentos. A sobrevivência em àreas inóspitas tornou-se possível graças ao transporte, permitido pela evolução na complexidade da organização humana. Mas estes padrões não são sinónimo de superioridade étnica, nem exclusivos às populações euroasiáticas: tem antecendentes na ocupação da polinésia ou de áfrica por grupos humanos.

Trabalho de génio, Guns, Germs and Steel é uma potente reflexão sobre o porquê da evolução das sociedades humanas, com argumentos convicentes, assente numa enorme erudição sobre a ontogénese humana. Evita e refuta argumentos falaciosos, apresentando um panorama alargado da evolução das sociedades humanas.