quarta-feira, 6 de agosto de 2008
Black Mass
John Gray (2007). Black Mass. Londres: Penguin
The Times | Black Mass
Com o fim da Guerra Fria chegou a dizer-se que a história tinha chegado ao fim. Não a história humana, mas a história dos ismos, cujas lutas sem quartel dilaceraram os séculos XIX e XX. Depois das lutas e revoluções, das libertações e dos discursos e ideais empolgantes, tudo pareceu terminar com a derrocada do regime soviético, e, com ele, de um dos maiores símbolos ideológicos estatizados. O ismo triunfante pareceu ser o capitalismo alicerçado na tradição liberal ocidental. E depois aconteceu o 11 de setembro, e o mundo regressou, e as engrenagens da história voltaram a entrar em movimento. No mundo globalizado e incerto, ameaçado pelo aquecimento global e pelas depredações dos capitalismos mais selváticos, uma nova ameaça se levanda: a dos fundamentalismos, dos quais o islâmico é o mais visível. Com ele, o regresso da ideologia quase messiânica do white man's burden, transfigurada na obrigação das democracias ocidentais de levarem o liberalismo contemporâneo aos quatro cantos do mundo, à força de baioneta se preciso for.
Baioneta é talvez um termo inadequado. Forças especiais, aeronaves de alta tecnologia e misseis de cruzeiro são os novos vectores de transmissão da democracia.
Os novos desafios do século XXI parecem sublinhar o triunfo do secularismo, a tradição nascida no iluminismo que separa a religião de todas as outras formas de filosofia social e política. Apesar do respeito e das tradições nacionais, nenhum estado moderno fala da religião como sua parte integrante. As visões místicas e religiosas foram relegadas aos campos espirituais. A vida económica e política passou a reger-se pelos princípios seculares.
Corresponderá esta visão à realidade? A tese de Gray indica-nos que não. Embora ostensivamente, e crivelmente, livre de misticismos, a visão secular não escapa às tradições religiosas dos seus países de origem. Em particular, Gray sublinha as visões apocalípticas de embate entre filosofias sociais e políticas, e os messianismos de propagação das ideologias, com a figura do revolucionário, combatente pela liberdade e pela ideologia como versão moderna dos mártires pela fé.
Gray ainda analisa a crescente influência dos novos fundamentalismos religiosos, particularmente os de origem cristã, nos acontecimentos geopolíticos recentes, reflectindo sobre as influências evangélicas na administração Bush e a sua ineptitude em controlar o Iraque.
Uma leitura indubitavelmente polémica.