segunda-feira, 23 de junho de 2008

Estradas da Informação

O governo decidiu estender o projecto e-escolas aos alunos do terceiro ciclo. É uma iniciativa louvável, mas que não estou a aplaudir. Antes de mais, o conceito do programa e-escolas é um conceito nobre: fornecer aos alunos, a baixo custo, as ferramentas essenciais da sociedade do conhecimento - o computador e o acesso à rede. A importância deste objectivo é indiscutível e inegável. A falha está na sua forma de implementação.

É preocupante a uniformização deste programa. As escolhas do e-escolas não são muitas, e reflectem interesses empresariais. Não é dada aos participantes no e-escolas muita hipótese de escolha de hardware e sistemas operativos. O hardware poderia ser adquirido através de vouchers, que permitissem aos participantes no programa adquirir os computadores que bem entendessem, suprindo do seu bolso os diferenciais de custo caso o preço da sua escolha fosse superior ao previsto. Mas isso não beneficiaria certas empresas, que vêem no e-escolas uma boa forma de escoar produto.

No software, a microsoftização de toda uma geração é altamente preocupante. O e-escolas não oferece alternativas. Ou windows, ou windows, com tudo o resto que lhe está associado. Estamos a falar de um enorme mercado potencial. Se todos os alunos se habituarem a ser utilizadores dos produtos microsoft, continuarão a sê-lo quando adultos. É a isso que serão habituados. Quem mexe nos interfaces tecnológicos conhece o valor da inércia do hábito - é a razão pela qual a maioria dos programas tem interfaces semelhantes. Sabendo que a microsoft estabeleceu parcerias com o governo português, tenho sérias dúvidas sobre a isenção desta escolha.

Mas estes não são os piores aspectos do e-escolas. O pior aspecto do programa é precisamente aquele que é considerado o melhor: o simples fornecimento de computadores. Porque o e-escolas não passa disso. É a estratégia da auto-estrada, que asfaltou boa parte do país, aplicada à auto-estrada da informação. Construam, que eles virão. Atirem computadores para as crianças, sem a mínima preocupação de formação, estratégia de uso ou sequer adaptação da sua usabilidade ao nível etário. Para todos os efeitos, o estado está a forncecer máquinas de jogos.

Não que esteja contra projectos como o e-escolas. São um passo essencial, e melhor ou pior, tinha que ser dado. Poderia ter sido dado noutros moldes. Resta às escolas, e resta-me, como professor, trabalhar a lacuna do e-escolas: estimular os alunos, ensiná-los a rentabilizar o computador, explorando todas as suas dimensões - de ferramenta de lazer, de trabalho e de comunicação. E, já que estou com a mão na massa, estimular a liberdade criativa, o uso de software livre, procurando alternativas ao domínio dos interesses comerciais neste momento em que o mundo evolui na direcção da sociedade da informação e conhecimento.