segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

300



IMDB | 300
Relatos de Heródoto sobre a Batalha das Termópilas

A história do Rei Léonidas, que com os seus trezentos soldados defendeu o desfiladeiro das Termópilas contra um esmagador exército persa, é um dos mais nobres capítulos da história humana, conto que galvaniza o espírito com a coragem indomitável e o sentido puro de dever. Sabemos que foi um momento decisivo nas guerras entre os povos da grécia e o poderio persa, talvez um momento decisivo para a história da humanidade. O sacrifício destes soldados, frente a um inimigo vastamente superior, permitiu à armada grega desbaratar a armada persa, e empurrou os exércitos de Xerxes de regresso à Pérsia. É um momento de nobreza, de abnegação total, de coragem levada ao limite, registado por Heródoto nas suas Histórias, que sublinha a lenda do rigor dos soldados espartanos, criados numa cidade que elevava as virtudes militaristas ao pináculo da sua civilização.

300 baseia-se no recontar desta milenar história por Frank Miller, mestre dos comics, senhor de uma estética muito própria baseada na estilização absoluta.

É difícil gostar deste filme. É também difícil não gostar dele. O ponto de vista, um arreigado nós contra eles, tem laivos desconfortáveis de fascismo, de conflito civilizacional entre o ocidente corajoso e o oriente decadente. Os homens que partem para uma guerra suicida, rindo-se do perigo, são um encarnar do ideial nietzschino de super-homem misturado com a spengleriana coragem decadente dos que defendem os portões da civilização contra as hordes bárbaras. Ideias que não andaram muito longe da mente dos responsáveis pelos períodos mais negros da história do século XX. 300, nesta nova ordem mundial de aventureirismos militares e guerras difusas, é um filme incómodo pela sua ideologia de apologia da violência como forma única de defender uma civilização. É difícil ver 300 sem pensar no Iraque, sem pensar na obscura guerra contra o terrorismo. O filme apoia-se claramente numa estética e numa filosofia de combate entre a luz e as trevas.

É essa visão de coragem absoluta em face dos mais incomensuráveis perigos o que torna 300 tão sedutor. Isso, e a beleza altamente estilizada das imagens do filme. A estética altamente cuidada, o bailado teatral de extrema violência física, a manipulação absoluta do ritmo, da luz e da imagem, são as marcas deste filme, que agarram o olhar no fascínio da glorificação da violência. Um prazer culpado, é certo...

Zack Snyder, o realizador, dificilmente ficará para a história do cinema como um criador de imponentes obras primas cinematográficas. No entanto, traz aos filmes que realiza um assinalável sentido estético, assente no perfeccionismo tecnicista. 300, filme estilisticamente perfeito, é um excelente exemplo de filme técnicamente perfeito, embora de ideologia duvidosa.