sábado, 27 de outubro de 2007

Ora, Eça...



Vários Autores, Eça Agora, 2007, Lisboa, Oficina do Livro

Eça de Queirós foi uma das personalidades ímpares da vida literária portuguesa do final do século XIX, um período em que portugal viveu uma rápida expansão e um desenvolvimeno, só comparável aos anos após a entrada na União Europeia. Imune aos brilhos da iluminação a gás e aos vapores das linhas de comboio novinhas em folha (e que ainda hoje são as mesmas linhas que estruturam o país ferroviário), Eça soube olhar, com uma ironia fina e elegante, para o velho problema português: por mais cultura e tecnologia com que nos carreguem, continuamos sempre com a mentalidade chico-espertista de sempre, com o provincianismo de ideias arreigadas, com o respeito a títulos vazios de sentido, com a paixão por caciques carunchosos que todos tão respeitosamente seguimos.

Era assim portugal no século XIX, e agora neste século em que o I muda de posição, será que está assim tão diferente? É essa (eça...) a resposta que um septeto de romancistas bem conhecidos do grande público tenta dar, revisitando o maior dos clássicos da literatura portuguesa, Os Maias, tentando olhar para o portugal do século XXI como Eça provavelmente olharia.

Eça Agora, romance escrito a catorze mãos por Alice Vieira, João Aguiar, Mário Zambujal, José Fanha, José Jorge Letria, Luísa Beltrão e Rosa Lobato Faria, leva o portugal contemporâneo de políticos duvidosos, dinheiro fácil, alta sociedade bacoca e cultura mediática aparvalhada ao completo absurdo. Mais do que uma revisitação, um novo olhar contemporâneo sobre Os Maias, Eça Agora é um ataque cerrado à mesquinhice mental portuguesa, um ataque muitas vezes pouco subtil, porque, enfim, os portugueses também não são muito subtis.

A leitura, cheia de ridículas peripécias (mas ridicularizar é a intenção, creio), é feita de um ritmo rápida de acontecimentos que se sucedem, imparáveis. Os protagonistas, herdeiros directos de Afonso e Carlos da Maia, depressa nos fazem mergulhar num mundo de socialites ninfomaníacas, de respeitados capitalistas com capitais de dúbia proveniência, de políticos inúteis, incompetentes e corruptos, providos de uma estupenda boçalidade, gente que consegue uma "bela carreira sem entrar na vida real".

O constante acumular de situações absurdas faz perder o rumo mais para o fim do livro. De qualquer forma, Eça Agora é uma boa leitura para aqueles que gostam de matutar na nhurrice congénita nacional.

(Desculpa lá, mas não resisti...)