quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Em Órbita



Alan Tribble, A Tribble's Guide to Space, Princeton, 2000

Princeton University Press | A Tribble's Guide to Space
New Scientist | A Tribble's Guide to Space

É precisamente aquilo que o título indica. Mas não dessa forma - o tribble do título refere-se ao autor, e não à praga de criaturas alienígenas que deixava mais esbranquiçados os cabelos do capitão Kirk e mais ponteagudas as orelhas de Mr. Spock. É apenas uma, de entre muitas, referências à série Star Trek (Caminho das Estrelas na língua lusa), da qual o autor é claramente fã.

Nesta era contemporânea em que a ciência desempenha um papel fundamental na nossa vida e sociedade, o papel da literatura de divulgação científica é fulcral. A ciência parece-nos sempre tão complexa, difícil e incompreensível, e de facto é-o, para quem não tiver as bases do conhecimento científico. Diz-se, por vezes, meio a brincar mas a sublinhar uma ideia muito séria, que a ciência é a nova religião, com os cientistas no papel dos velhos sacerdotes detentores de um conhecimento secreto e esotérico. Não é nada assim, mas é também necessário que a ciência vá de encontro à pessoa comum, para que ela a possa compreender e utilizar, mesmo sem ter as bases mais profundas. São necessários conhecimentos vastíssimos de matemática e física avançada para se compreender a fundo as grandes questões sobre a origem do universo, por exemplo, mas é possível simplesmente conhecer as questões sem essa bagagem. A existência de uma cultura científica é fundamental, porque permite fazer compreender o mundo tecnológico que nos rodeia e permite também pensar sobre as grandes questões do devir humano sem cair nas falácias das superstições, religiões ou "teorias" alternativas.

Confesso que o meu gosto pela ciência, que não se traduziu numa vocação científica mas me deixou com uma curiosidade inquieta e insaciável pelas ideias que tentam compreender a estrutura do mundo foi despertado não na sala de aula (onde, por exemplo, a minha professora de física, arreigada a fórmulas, se esforçou imenso para que eu detestasse física, gosto que só adquiri muito mais tardiamente) mas sim através da excepcional série de documentários de Carl Sagan que foi Cosmos. A combinação de rigor científico com grande erudição cultural e imagens arrebatadoras do cosmos despertaram a minha mente para a ideia de universo. Só depois é que me iniciei na FC, que levou o meu gosto pelos espaços noutros sentidos. Não por acaso, andam nas minhas prateleiras uma série de livros escritos por Sagan. A sua combinação de optimismo, curiosidade, rigor e erudição sempre me fascinaram.

Outros livros de divulgação científica houve que me marcaram. Os escritos por Stephen Hawking, marcados por um rigor e uma clareza absoluta, ou as loucuras matemáticas descritas por Rudy Rucker, as sínteses de Michiu Kaku ou o jornalismo bem informado de James Gleick, citando alguns exemplos. Livros da Gradiva, claro. Mas a ideia que desejo sublinhar é a da importância da divulgação da ciência, apoiada numa boa prosa. Outros livros houve que li, onde a pouca clareza das palavras obscureceu ideias já de si um pouco obscuras para os leigos na matéria.

A Tribble's Guide to Space é um livro muito superficial. Aborda, de uma maneira muito ligeira e resumida, um pouco de tudo sobre a exploração espacial, desde a sua história aos seus objectivos, passando pelas técnicas que permitem ao homem chegar à órbita. Mas embora superficial, é rigoroso. Sobre cada secção da obra poder-se-ia escrever uma tonelada de livros. A mistura de factos científicos puros com anedotas da história astronaútica, entremeados com referências à cultura popular (tantas, mas tantas referências a Star Trek que desisti de as contar) torna este A Tribble's Guide to Space numa leitura imparável, em que os olhos, agarrados às páginas, só páram quando literalmente o livro chega ao fim. É, por isto, um livro precioso - fala de ciência de uma forma simples e acessível, mantendo o interesse desperto como se de um empolgante romance se tratasse. Fazia falta uma tradução portuguesa.