Ontem, hoje e sempre!
Passou mais um ano sobre o dia que mudou o Portugal moderno.
É tema controverso. Alusões ao 25 de abril são o suficiente para despertar discussões viscerais sobre o que está certo e está errado, sobre o que foi bem ou mal feito.
As vozes saudosistas ainda sussurram "antigamente é que era bom", com as memórias desvanecidas. Já não se recordam de que antigamente nunca foi bom. Outros relembram as promessas, relembram o país com que sonharam, que não é bem o país que temos hoje.
O 25 de Abril foi um marco na nossa história, uma singularidade, um ponto de convergência que tinha de acontecer, que colapsou um sistema injusto e caduco e ao qual se seguiu um confuso e necessário período de ajustamento. Muito foi sonhado, talvez muito esteja por cumprir.
Há muito ainda por ser feito. Mas é inegável o salto que o país deu nestes 30 anos, salto esse que foi propiciado pela revolução de Abril. Se abril não tivesse acontecido, o regime ter-se-ia certamente desmoronado, mas de forma controlada, preservando os privilégios das oligarquias e os poderes da classe política do regime. Ou então não se teria desmoronado, e viveríamos hoje num sucedâneo da Coreia do Norte à beira mar plantado, embora as cores fossem muito diferentes. Certamente que menos avermelhadas. De qualquer das maneiras, prefiro o país de hoje - ainda pobre e desigual, imperfeito, por vezes caótico, mas muito menos pobre e desigual do que no antigo regime. Não vivemos num país perfeito, mas pelo menos temos futuro. o atraso retrógrado em que vivíamos foi invertido. Não tanto como gostaríamos, mas longe já vão os tempos do analfabetismo. Hoje o analfabetismo total já não existe, e foi substituído pelo analfabetismo funcional, vulgo iliteracia. Isso é bom? Não, mas sim se percebermos que não saber ler é de certeza não conseguir compreender nada, e saber ler mas não saber compreender já é pelo menos um passo em frente. Faltam ainda muitos mais passos, algo que devemos sublinhar, pelo menos a cada dia 25. Se não o fizermos habituamo-nos ao estado das coisas, o marasmo regressa. As promessas podem estar por cumprir, mas nem por isso devem ser esquecidas.
Nesta época, em que se vivem saudosismos e nostalgias alicerçadas num falso sentimento de insegurança alicerçado na pretensa qualidade das instituições passadas, é preciso recordar. Estamos a ser moldados por forças contrárias à construção de uma sociedade mais justa. Não é um fenómeno local, é antes um fenómeno mundial, alicerçado num liberalismo cego que se pode revelar autodestrutivo.
As grandes palavras de ontem são inúteis se não se forem repetindo hoje e amanhã, se os ideais ontem reafirmados se desvanecerem nos hojes e amanhãs futuros.
Hoje, os peões de brega falam outras línguas, provéem de outras terras. Ainda somos um país de muitas desigualdades, um país ainda com muito para andar. Mas pelo menos temos um caminho aberto.