domingo, 25 de março de 2007
A Comenda Secreta
Maria João Pardal/Ezequiel Marinho, A Comenda Secreta, Ésquilo, 2005
Ésquilo | A Comenda Secreta
À partida, o livro prometia. Única obra portuguesa nesta colecção dedicada às ficções imaginadas sobre segredos conspiratórios, A Comenda Secreta envolve segredos esotéricos, história de Portugal, percursos iniciáticos e a sempre intrigante arquitectura do convento de cristo em Tomar.
O trajecto do enredo acompanha um trio estranho, uma trindade, quase se diria, composta por Renato, um jovem que se prepara para uma vida como frade guerreiro da ordem templária, Abel, filho do rabi da Lisboa medieva e conhecedor dos caminhos ínvios do esoterismo, e Catarina, filha de um cavaleiro e de uma bruxa pagã que transporta consigo um segredo intemporal. Esta estranha trindade vê-se envolvida numa conspiração que decorre enquanto em Tomar se lançam as primeiras pedras do convento de cristo, destinado a albergar mais do que uma igreja: o segredo do convento envolve um fantástico tesouro e oculta uma entrada para um fabuloso mundo subterrâneo.
A verdade é que o livro promete, mas acaba por se afundar num mar de incoerências. A história arranca aos sobressaltos, e por vezes, entre parágrafos, consegue mesmo não fazer sentido. Há pormenores mal explicados, situações criadas que acabam por nem sequer se deslindar, enquanto outras situações parecem surgir do nada, sem qualquer explicação viável. Se algum cuidado foi colocado na descrição dos locais históricos - a Lisboa acabada de conquistar aos mouros, o Portugal selvagem dos tempos da reconquista - a caracterização das personagens deixa muito a desejar, com modos de pensar estranhamanete contemporâneos para homens medievais. Para piorar, o livro é uma obra de puro proselitismo esotérico, que tenta funcionar com vários níveis de sentido que se resolvem em infodumps esoteristas difíceis de enquadrar numa história que aparentemente se queria dinâmica.
A coisa começa a correr mal logo no prefácio, onde os autores se dispersam em direcção a vocações nacionalistas de cariz espiritual, afirmando a crença numa tradição espiritual, mariana e marítima (sic), à qual só apetece juntar as insignes tradições de deus, pátria e família. Um livro sobre os quintos impérios e os fulcrais conhecimentos ocultos a que só uma élite iluminada entre élites consegue ter acesso até poderia funcionar bem. Mas este livro leva-se demasiado a sério, e entre as peripécias inverosímeis de uma história que poderia ser melhor contada, perde-se em ruminações sobre percursos iniciáticos, agartha, cavernas ocultas sobre Tomar, sincretismos religiosos e tesouros fantásticos. Bem, mas que mais se pode dizer sobre um livro que intrepreta o nome portugal como porto do graal?
E assim se vai mais uma obra deste género de ficção que, até agora, se tem mostrado bem desapontadora. Por detrás de capas elegantes e com premissas fascinantes, capazes de despertar a curiosidade de qualquer leitor, encontram-se obras entediantes, em alguns casos escritas com bastantes falhas. Não consigo deixar de observar que falta groove à pulp fiction contemporânea.