sábado, 8 de abril de 2006

Against The Fall Of Night

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Wikipedia | Arthur C. Clarke

Arthur C. Clarke dispensa apresentações. O seu nome é o perfeito sinónimo de ficção científica. Há mais de cinquenta anos que Arthur C. Clarke é sinónimo da melhor ficção científica que é publicada. O seu rigor tecnológico e optimismo num futuro da humanidade potenciado pela tecnologia inspiraram, e ainda inspiram, cientistas e escritores em todo o mundo. Arthur c. Clarke é autor de alguns dos livros absolutamente essenciais da ficção científica, e a sua inusitada colaboração com Stanley Kubrick deu ao mundo 2001, um dos mais esplendorosos filmes de ficção científica jamais realizados.

Arthur C. clarke tem pontos fracos, claro. O seu inabalável optimismo no futuro da humanidade traduz-se em romances em que o que é aprofundado é a visão do futuro - das suas arquitecturas, das suas tecnologias, das suas descobertas. Pelo contrário, as suas personagens, os seres humanos que dão o mote às suas histórias, são na sua generalidade perfeitamente bidimensionais, desprovidas de profundidades psicológicas, perfeitas peças de maquinaria social. Mas, se querem ler sobre profundidades psicológicas, vão ler o Guerra e Paz ou qualquer outra grande obra literária.

Publicado em 1953, mas constituindo na realidade o seu primeiro romance (Clarke começou a escrever o livro nos anos trinta), Against The Fall Of Night é ficção científica clássica no seu melhor. O livro assenta num dos pressupostos básicos da FC, uma das ideias-base que inspiram livros de FC, uma ideia que H. G. Wells também explorou no clássico A Máquina do Tempo. O futuro pode trazer-nos muita coisa - nova e maravilhosa tecnologia, novos e maravilhosos conhecimentos. Mas a vida tranquila e a fácil abundância trazida pelo futuro pode tornar-nos complacentes, fazendo-nos abandonar a nossa eterna busca exploratória de novos conhecimentos e assentando-nos num confortável patamar de pequenos luxos. Levada ao seu extremo, este ideário leva-nos a uma sociedade de simpáticos ignorantes, rodeados de tecnologia que propicia o nosso luxo, mas cujos conhecimentos técnicos e descobertas científicas nos estão enternamente vedados, pois na confortável degenerescência esquecemos tudo aquilo que a humanidade lutou tão àrduamente para descobrir.

Em Against The Fall Of Night acompanhamos Alvin, a primeira criança a nascer na cidade de Diaspar em sete mil anos. Diaspar é o ocaso da humanidade. Diaspar é uma cidade perfeita, onde os seus habitantes vivem rodeados de todos os luxos e amenidades, controlada por máquinas que nunca se esgotam, nunca se avariam e que os habitantes da cidade mal compreendem. Em Diaspar vive o que resta da humanidade, em altas torres rodeadas por deserto, pois a humanidade abandonou o sonho das estrelas, graças a uma mítica ameaça de bárbaros invasores que haviam destroçado todo o império espacial terrestre, espalhado por míriades de planetas, e haviam apenas sido miraculosamente travados numa batalha final na Terra. Sendo quase imortais, rodeados de todos os luxos e confortos, os habitantes de Diaspar são notóriamente conformistas, e nem sequer pensam no que poderá estar além das muralhas da cidade. Enclausurados na sua cidadela no fim dos tempos, os restos envelhecidos de uma humanidade envelhecida perderam todo o espírito de curiosidade exploratória que é o melhor que a humanide tem. Mas Alvin não pensa da mesma forma, e vive consumido por sonhos de descobrir o que estará para além de Diaspar. As suas buscas por um ponto de fuga da cidade são auxiliadas por Rorden, um bibliotecário que tem a seu cargo as máquinas analíticas que detém todos os registos históricos dos biliões de anos da humanidade. Juntos, descobrem que Diaspar já foi um grande centro, para o qual confluíam inúmeras linhas de transporte. Descoberta a estação principal, esquecida debaixo de um parque de Diaspar, Alvin e Rorden apercebem-se que uma das velhas linhas ainda está a funcionar. Temerário, Alvin entra numa carruagem que o leva através de um vasto sistema de túneis até Lys, a outra última cidade da humanidade. Lys é tudo o que Diaspar é, e não é. Lys é uma cidade de muitas culturas, rodeada pela natureza, que trocou a imortalidade pela perpétua renovação. Mas no fundo, os habitantes de Lys são como os de Diaspar. Ciosos dos seus luxos, com medo de míticas ameaças exteriores, são conservadores e desejam evitar a todo o custo contaminações culturais que alterariam a estabilidade da vida nas cidades.

Numa visita a Shalmirane, local da mítica batalha final entre a Terra e os invasores alienígenas, Alvin descobre um mistério: o último acólito de uma estranha religião segreda-lhe que, há milhões de anos atrás, um homem viera do espaço com histórias maravilhosas de civilizações que habitavam as estrelas. Esse homem deixara as suas ideias, e os seus robots. Alvin ganha o controle de um desses robots, e graças a ele consegue descobrir aquilo que a humanidade julgava já inexistente: uma antiga nave espacial. A bordo da nave, Alvin visita o centro da galáxia, rodeado de planetas cheios de vestígios de civilizações desaparecidas. O desespero toma conta de Alvin - a vida, a vida inteligente que ele julgava espalhada pelo universo, afinal apenas tem o seu último refúgio na Terra. O universo velho de biliões de anos encontra-se tão desprovido de vida como um vasto deserto. É neste momento que Alvin encontra Vanamonde, uma inteligência pura que vagueia pelo vasto e solitário universo, atraído pelas faíscas de inteligência de Alvin. Alvin regressa à Terra, trazendo consigo Vanamonde. A presença desta inteligência revoluciona Lys e Diaspar. As informações de Vanamonde falam de um passado glorioso, de uma humanidade que durante milhões de anos foi incansável na sua tentativa de se transcender, até ter sido bem sucedidada. Se o universo é solitário, é porque os seu habitantes transcenderam-se, e migraram para além do universo. Só restou a Terra, desprovida de ambições, que se refugiou em mitos para justificar a sua decadência moral.

Alvin cataliza a nova humanidade, e volta a despertar sonhos de grandeza e esperança no futuro.

Against The Fall Of Night é um livro belo. É um daqueles livros apaixonantes que combinam a inocência da ficção científica golden age, cheia de esperança num futuro tecnológicamente avançado, com visões exóticas de cidades futuras, planetas futuros e sociedades futuras. Tão fascinante como perceber o declínio da humanidade é imaginar os vastos espaços arquitectónicos de Diaspar, com os seus arranha-céus mágicos, detentores de todos os confortos. Mais de cinquenta anos passados sobre a sua concepção, Against The Fall Of Night é um livro datado. O futuro que Arthur C. Clarke imaginou nos anos quarenta tem muito pouco a ver com os futuros que hoje imaginamos. Os seus conceitos tecnológicos e sociais estão datados - as suas máquinas analíticas, por exemplo, examinam milhares de... cartões perfurados para dar as suas respostas. Mas a inocência e o extismo deste futuro distante imaginado por Clarke continuam a manter Against The Fall Of Night como um livro profundamente apaixonante.