quarta-feira, 29 de março de 2006
The Fleet of Stars
Wikipedia | Poul Anderson
SFWA | Poul Anderson
Poul Anderson é um dos grandes nomes da ficção científica clássica. Com uma carreira que se iniciou nos pulps clássicos, como a Amazing Stories, Poul Anderson é um dos autores que fez a ponte entre a ficção científica da era clássica, a golden age, e a hard sf moderna. Poul Anderson é rigoroso na extrapolação ideológica e teconológica que faz nos seus saltos ao futuro. Na ficção de Anderson, a tecnologia futura é plausível e não viola os limites estabelecidos pela relatividade. Mas a tecnologia não é o mais importante na obra de Anderson. Anderson tornou-se exímio a pintar grandes dioramas espaciais, em que a verdadeira aventura não é a vivida pelos personagens dos romances, mas a vivida pela humanidade enquanto cumpre o seu destino nas estrelas.
The Fleet of Stars é parte integrante de um desses dioramas, uma Space Opera que abrange o futuro próximo e termina séculos depois. No futuro próximo, o interesse na exploração espacial é reavivado por consórcios privados, que colonizam a lua em busca de lucros e novos materiais. Ao fazê-lo, transformam radicalmente a sociedade humana. Séculos depois, a humanidade encontra-se espalhada e dividida. Parte da humanidade orbita o sistema solar, habitando uma terra que mais se assemelha a uma reserva natural, em que as unidades territoriais a que estamos habituados se alteraram radicalmente a favor de confederações pós-governamentais que associam pessoas e territórios de interesses semelhantes. A lua é habitada por colonos terrestres, que têm de fazer o parto dos seus filhos num habitat espacial que simula a gravidade terrestre, que convivem com os lunarianos - os descendentes dos primeiros colonos da lua, genéticamente modificados para sobreviverem nas condições ambientais lunares. Marte também é habitado, por um punhado de colonos terrestres e lunarianos que estóicamente se aguentam em Marte, apesar do desinteresse demonstrado nas colónias marcianas pela sinergia - o governo que abarca todos estes territórios, que confedera a Terra, a Lua, Marte, o cibercosmos (uma entidade constituída pela ligação em rede das inteligências artificiais computacionais) e os synnoionts, híbridos entre o ser humano e o computador, com implantes neuronais que os tornam capazes de fazer a ponte entre a consciência humana e a consciência cibernética. A humanidade vive contente dentro destes estreitos limites, contente em ter as suas necessidades básicas asseguradas e permitindo que as inteligências artificiais do cibercosmos os governem sob uma tirania benevolente.
No entanto, as consciências agitam-se. Alguns entre os homens sentem-se meros animais de estimação, negados ao acesso à mais humana das vontades pelos computadores: a vontade de explorar, de ir mais além. Existem rebeldes, que colonizam a custo Proserpina, um asteróide nos limites exteriores do sistema solar, bem como vários dos cometas da cintura de Kuiper. E, mais além, em Proxima Centauro, as naves colonizadoras humanas que largaram a Terra há séculos atrás conseguiram estabelecer colónias permanentes em três dos planetas do sistema. Essas colónias representam uma nova iteração da humanidade, uma nova mesclagem entre consciência humana e tecnologia, capaz de terraformar planetas alienígenas. E, no ar, paira um segredo: o que é que o cibercosmos anda a esconder? Os resultados da observação do centro da galáxia por parte dos observatórios orbitais situados nos limites do sistema solar são consistentemente suprimidos, pois contém um segredo capaz de abalar toda a humanidade.
É sobre este diorama espacial que se movem os personagens deste livro: Fenn, um colono lunar determinado a recuperar a exploração espacial tripulada com a ajuda de dos Lahui Kuikawa, uma curiosa nação transpacífica que deseja criar um novo oceano em Marte; Chuan, o sinnointe que representa o cibercosmos (e assim representa aqueles que de facto governam a humanidade) no planeta Marte; e Anson Guthrie, não o original Anson Guthrie que lançou a humanidade para o espaço há séculos atrás, mas uma cópia digital, um download da sua consciência enviado pelo planeta-mãe Amaterasu (uma das novas colónias em Proxima Centauro) que é enviado de volta ao sistema solar para tentar o que é que se passa no berço da humanidade.
The Fleet of Stars é um livro trágico, em que o revelar de segredos e a eterna busca humana por mais conhecimento através da exploração só traz consigo desgraça a curto prazo. Mas a mensagem é clara (e pervasiva na obra de Poul Anderson): a confortável uniformidade, a estabilidade recheada de bens e confortos, o patamar estável para o qual todas as sociedades humanas parecem sonhar em convergir, é um veneno perigoso, que aniquila a humanidade através da inacção e da entropia. O sonho humano de ir mais além é a nossa única defesa contra a confortável degenerescência.