quarta-feira, 11 de janeiro de 2006
Psycho
Wikipedia | Alfred Hitchcock
Wikipedia | Psycho
IMDB | Psycho (1960)
Alfred Hitchcock ficou para a história do cinema como o realizador dos melhores filmes de suspense. Profundo adepto do ocultar para tantalizar, despertando a curiosidade mórbida dos espectadores, Hitchcock tornou-se sinónimo de histórias bem contadas, em que cada plano de câmera revela sempre mais um pouco, embora sem tudo revelar, deixando o espectador sempre ansioso por descobrir mais. Implacável nos seus filmes, Hitchcock ia deixando os espectadores formar as suas teorias sobre quem cometeu que crime, quem é culpado ou inocente, para nos últimos instantes de filme nos retirar o tapete debaixo dos pés e revelar-nos uma realidade profundamente diferente de tudo o que imaginávamos.
Com este currículo, não é de surpreender que Hitchcock também tenha ficado para a história do cinema como o realizador de um dos mais perturbantes filmes de terror jamais realizados.
Psycho inspira-se vagamente no romance homónimo de Robert Bloch, autor de alguns interessantes livros do género terror, e argumentista da fabulosa série de televisão The Twilight Zone. Da primeira série, convém esclarecer, ainda filmada a preto e branco. Por sua vez, Bloch inspirara-se vagamente na vida e obra de Ed Gein, prototípico e lendário serial killer que chocou profundamente a américa com a descoberta de macabros objectos feitos em osso e pele humanas na sua semi-arruinada quinta da américa rural. Ed Gein é também a inspiração por detrás de clássicos do gore como o The Texas Chainsaw Massacre e outras iterações do tema do serial killer (o Silêncio dos Inocentes é um exemplo).
Apesar de interligado ao suspense, Hitchcock é um realizador do mainstream, mais preocupado com a psicologia dos seus personagens do que em encher os ecrãs de cinema de sangue a esvaír-se de selváticas feridas múltiplas. É esta interpretação de uma simples história de um serial killer que torna Psycho tão interessante. Ainda mais, há que assinalar que Hitchcock é um mestre em revelar-nos pouco ou nada. Durante metade do filme, cremos que o filme não é sobre assassínios mas sim sobre roubos. E passamos o resto do filme a tentar vislumbrar a hipotética assassina, a mãe de Norman Bates, que no final é revelada como sendo um mero cadáver mumificado. Só o final traz consigo todas as explicações, com um psicólogo a explicar-nos o funcionamento da mente perturbada do psychokiller.
Psycho inicia-se com uma história de amor. Marion Crane, a entrar nos trinta anos e a sentir que a vida lhe está a fugir, pressiona o seu namorado para que case com ela. Este, carregado de dívidas, promete-lhe que o tenciona fazer assim que se tiver livrado de todas as dívidas. Marion, desesperada, regressa ao seu emprego, onde lhe surge uma oportunidade única, extremamente tentadora, e rouba 40.000 dólares. Marion faz-se à estrada, extremamente nervosa e inquieta pelo crime que acabou de cometer, e tenta chegar à cidade onde vive o seu namorado. Durante a noite, cansada da viagem e perante uma forte chuvada, Marion decide passar a noite num motel à beira da estrada. Inicia-se assim a parte mais violenta do filme, com a entrada de Marion no Bates Motel, dirigido por Norman Bates, um jovem que não parece ter largado as saias da mãe. Na mente distorcida de Bates, Marion aparece como uma hetaira imoral e provocadora, que o vai desviar do bom caminho. Esta distorção mental leva-o a perder a consciência, assumindo a personalidade da sua mãe, e a assassinar Marion, na aterrorizante e famosa cena do chuveiro. O resto do filme deslinda-se numa história de policial negro, com um detective privado em busca do dinheiro e o namorado e a irmã de Marion a confrontarem Norman Bates com o desaparecimento de Marion. Convencida de que a mãe de Norman Bates é a chave do mistério, a irmã de Marion infiltra-se na tenebrosa casa de Bates e tenta falar com a mãe de Bates, apenas para descobrir que esta é um cadáver mumificado. Aterrorizado perante a perspectiva de ser descoberto, Bates tenta assassinar a irmã de Marion, mas é detido. No final do filme, é-nos explicado como a mente de Bates albergava duas personalidades, a de um rapaz bem educado que só tenta agradar à mãe, e a da imagem da mãe como alguém que exige e obriga o seu filho a fazer aquilo que ela quer. Psycho termina com um Norman Bates totalmente dominado pela personalidade da mãe.
Psycho inspirou várias sequelas, infinitamente menos interessantes, sempre com Anthony Perkins (o actor que deu vida a Norman Bates) no papel do serial killer que promete descanso eterno aos viajantes que pararem no seu motel para descansar das suas viagens. A cena aterradora de Marion Crane a ser assassinada no chuveiro, com a música alucinante a acompanhar o ritmo das facadas de Bates, por sua vez parece ter inspirado todo um género de cinema de terror, o filme slasher, protagonizado por diversas versões de serial killers personificadas em Jason de Friday the 13th (e suas inúmeras sequelas, Michael Myers de Halloween ou Freddy Kruger de Nightmare on Elm Street, isto para citar os mais conhecidos. São filmes muito básicos, em que o serial killer, de faca em riste, assassina das formas mais sangrentas de que os realizadores se possam lembrar virginais raparigas preferencialmente pouco vestidas.
Psycho é um filme atípico na carreira de Hitchcock, devido à sua violência explícita, pouco comum num realizador profundamente interessado em dramas psicológicos. Posto isto, quarenta e cinco anos após a sua realização, ainda continua a ser uma obra de referência para os amantes do cinema arrepiante.