Se há uma tendência que noto em mim nesta segunda semana de aulas é que não me está a apetecer mesmo nada dar aulas. É um sentimento estranho, que tem pouco a ver com as manigâncias do ministério ou as indisciplinas dos alunos, as quais, diga-se de passagem, muito raras na escola onde trabalho. Pelo menos, se comparado àquilo que os meus calos de anos a aturar putos mesmo muito mal comportados me habituaram. Mas não consigo considerar alunos que me chamam de senhor professor (note-se que não usam a expressão stôr ou outras menos apropriadas) maus alunos. Mesmo quando se portam mal.
Eu até me levanto mais cedo para ir até à escola (o que é natural, porque os atrasos pagam-se com a portagem mais cara que conheço). Vou muito bem disposto pela estrada fora, agora ao som apaixonante de Miles Davis. Chego à escola bem disposto, fumo o meu cigarrinho e bebo o meu cafézinho cheio de boa disposição. Até dou dois dedos de conversa, digo uma piadinha ou outra (mais ou menos mórbida, depende do dia), e a minha boa disposição estende-se até a falar com aqueles meus colegas aos quais, regra geral, não ligo muito. Vou bem disposto dar as aulas, e saio de lá bem disposto.
Mas não me apetece nada ter de ir dar aulas. Mesmo nada. É paradoxal, mas é assim que me sinto. A falta de vontade não me afecta em nada, mas está lá. Perante a perspectiva de mais uma aula, reajo com um pensamento de desagrado. Mas dou-a, com muito gosto, na mesma.
Qual é a explicação que encontro para esta incongruência? Sabendo que boa parte dos meus colegas de profissão dispendem parte do seu tempo livre no sofá do psicólogo ou estão na casinha amarala a tempo inteiro, suspeito que este paradoxo significa que é melhor começar a pensar em enlouquecer agradávelmente.