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The Micronations Page
Model Nations
Alguns anos atrás li na Wired um artigo delicioso sobre micronações: estados mais ou menos imaginários que reclamam uma soberania mais ou menos imaginária sobre locais mais ou menos imaginários. O artigo da Wired versava sobre Sealand, um bizarro principado que declarou a independência da grã-bretanha nos anos 60. Sealand fica situada mais ou menos no meio do canal da mancha e é constituída por uma plataforma de anti-aéreas deslocada pela marinha britânica para o meio do canal para defender a inglaterra da luftwaffe durante a segunda guerra mundial. Nos anos sessenta, a plataforma abandonada foi ocupada por um promotor de rádios pirata para servir de base de operações. Processado em tribubal, os tribunais britânicos recusaram-se a condenar o radialista por considerarem que, estando a plataforma abandonada para além dos limites das àguas territoriais britânicas, não estava sujeita às leis da coroa inglesa. Inspirado pela decisão, o pirata/radialista proclamou a sua independência, e coroou-se príncipe de Sealand. O governo inglês não lhe ligou muito. No final dos anos 90, Sealand passou de mera curiosidade a uma perigosa realidade quando uma empresa especializada em serviços de dados sensíveis via internet decidiu escolher Sealand como o local para albergar servidores carregados de dados sensíveis - coisas como pornografia ilegal (sim, essa mesmo, pornografia pedófila) ou dados financeiros de clientes que não gostam muito de pagar impostos aos países onde vivem. A lógica por detrás desta medida está na aplicabilidade da lei - se Sealand for considerada parte do território britânico, aplica-se a lei britânica e as convenções internacionais a que a inglaterra adere; se não, Sealand é um santuário para dados sensíveis e transações criminais. Apesar de constituir um embaraço para o governo inglês, mesmo assim os ingleses não ligaram muito a tão bizarras pretensões.
Sealand é apenas a face mais mediática de uma tendência bizarra que, graças à interconectibilidade e influência da internet se está a espalhar - a criação de países imaginários, com sistemas políticos vibrantes, pretensões territoriais e até mesmo línguas próprias. Sob o seu aspecto mais inofensivo, não passam de fantasias adolescentes mantidas por adultos como um hobby pouco convencional. Enfim, percebem, para além de serem homens de trabalho e membros tranquilos da comunidade também são imperadores nas horas vagas. Aliás, como sintoma da fantasia que sublinha estas micronações há que observar que a maior parte delas são monarquias. No seu aspecto menos inofensivo, as micronações são esquemas criados por pessoas que querem deixar de pagar impostos aos países de que são cidadãos, paraísos utópicos ultra-liberais que prometem a libertação da tirania dos estados e a criação de um paraíso de livre iniciativia livre de constrangimentos legais, esquemas bizarros de venda de passaportes que não podem ser considerados falsos (o país não existe, realmente, por isso não é falsificado) ou plataformas de conotação criminosa, como o caso de Sealand.
Para além de sealand, existem outra micronações que têm alguma exposição mediática - tratam-se do Freedom Ship, presença habitual em programas televisivos sobre engenharia, um barco-cidade que viajaria constantemente pelos oceanos; do principado de Seborga, um enclave em itália que emite selos e passaportes embora viva cordialmente com a "ocupação" italiana, ou Hay-on-Wye, capital britânica dos alfarrabistas, que se declarou independente como forma de publicidade.
Explorem, através dos links acima, este bizarro fenómeno. Maravilhem-se com as estranhas obsessões destes criadores de países imaginários. Descubram a diferença entre micronações e micropaíses - esses anacronismos geográficos, como o Lichtenstein, o Luxemburgo ou o Mónaco. Descubram, como eu, que existe uma entidade reconhecida como estado, com embaixadas em noventa e quatro países e estatuto de observadora das nações unidadas, que não detém qualquer território - trata-se de um fóssil medieval, a Ordem dos Cavaleiros Hospitalários, um estado cujo governo se alberga em Roma após a conquista de Malta por Napoleão no virar do século XIX.
O rei de Talossa, uma das maiores micronações de fantasia, resumiu muito melhor do que eu este conceito quando escreveu sobre a liga de estados secessionistas: an attempt to unite all existing Micronations into a common front against so-called reality.
As micronações são um belo passatemo para quem goste tanto de viver em mundos irreiais que os cria.