quarta-feira, 7 de dezembro de 2005

Através do Buraco da Fechadura

Então, hoje não se escreve nada? Estava difícil... não é que não faltem assuntos, não é que o dia fosse propício a pensamentos dignos de serem publicados neste blog. Aliás, como o dia se previa solarengo e cheio de reuniões, certamente que teria imenso que dizer sobre o estranho costume cultural dos professores que é a REUNIÃO - estranho ritual esotérico que todos detestam mas que todos frequentam.

Mas há dias assim... dias que começam bem, e dias em que começamos trancados do lado de fora da porta de nossa casa (o que vale é que eu estava vestido). Não foi nada de esotérico, nenhum acontecimento do tipo vir à rua enrolado na toalha de banho e em pêlo por debaixo e ficar a olhar para uma porta fechada e a imaginar as chaves deitadinhas em cima da mesa que fica para lá da porta. Nada tão aventuroso. Apenas a minha chave (cara) da minha porta (cara e blindada) da minha casa (muito cara e sobrevalorizada) decidiu deixar de destrancar a porta, após a trancar. Porquê? Porque é feita de um material tão resistente que vergou com o uso e se partiu à primeira tentativa de o endireitar.

Quase tive um ataque cardíaco. Mais umas destas e caminho definitivamente para uma ala hospitalar dedicada a doentes do coração. Imagens aterrorizantes perpassaram-me pela cabeça - a porta arrombada, um serralheiro a aniquilar a fechadura, os bombeiros a fazerem subir uma escada até à varanda da cozinha e a quebrabrem a janela da cozinha para entrarem em casa e abrirem a porta, talvez à machadada ou com uma tocha de acetileno. Felizmente, antes de desmaiar de susto, tive a presença de espírito de me lembrar que qualquer uma das outras chaves ainda fosse capaz de destrancar a porta. Se assim não acontecesse, então é que o caldo estava entornado.

Transtornado por estes pensamentos, fui trabalhar. Esperava-me um dia com duas aulas, um presépio para acabar e notas para dar, rematado à laia de sobremesa por duas prazenteiras reuniões. Como só podia obter uma segunda chave à tarde, dei as minhas aulas e faltei às reuniões - uma acção inteligentíssima da minha parte. É que, vejam, sempre que se falta a uma reunião, a falta deve ser justificada com um artigo a dois tempos lectivos. Duas reuniões, quatro tempos (boa matemática, hein?). Só que para efeitos de justificação de faltas, um dia de trabalho de um professor equivale a... quatro tempos, o que significa que as duas aulas que hoje dei, de dois tempos cada (dá quatro, génios das contas), foram, literalmente, dadas. A ministra certamente que agradece a minha dedicação e os meus colegas certamente que irão elogiar a minha estupidez. Mais valia ter passado a manhã a passear pelas praias da Ericeira - estava maré baixa, e um dia solarengo, com um daqueles solzinhos quentes de inverno em que só apetece deixar que a pele absorva os raios solares. Alaparmo-nos como lagartos em cima das rochas quentes a apanhar sol.

Mas, como eu nunca mais aprendo...