Estamos a viver dois acontecimentos que há já alguns anos estavam previstos. Não se sabia quando, ou talvez onde, mas sabia-se que as probabilidades de acontecerem eram altas. No entanto, estão a agora a acontecer, e todos se mostram chocados e surpreendidos.
Desde os anos 90 do século XX que se percebeu que a conjugação de factores como o encurtar de distâncias proporcionado pelos transportes aéreos, a progressiva destruição de habitats naturais que libertam para o contacto humano agentes patogénicos “adormecidos” no meio das selvas, e as terríveis condições de sanidade num mundo cada vez mais urbanizado, mas nem por isso mais saudável, poderiam gerar uma pandemia à escala mundial. Temeu-se o ébola (imaginem uma pessoa infectada pelo ébola a sofrer os sintomas num voo intercontinental), temeram-se doenças mais exóticas, mas a primeira grande pandemia parece ser a da gripe das aves. Pode não ser uma doença exótica, mas lembrem-se: o salto dado pelo vírus, das aves para os homens, será dado por causa do intenso contacto com aves em condições de pouca salubridade (ou nenhuma) das explorações avícolas. Explorações essas que produzem carne em grande quantidade para exportação de um ponto a outro ponto do globo. Cá estão os ingredientes de uma pandemia global, agravada pelas deslocações: um indivíduo engripado que entre a bordo de um avião entre a Europa e as Américas estará a transportar o vírus.
Hoje, Paris parece ser uma cidade sitiada. A cidade das luzes, elegante capital cultural europeia, está a viver momentos terríveis com a violência explosiva que grassa nos bairros suburbanos. Há já várias noites que os acontecimentos se resumem a verdadeiras batalhas entre os jovens dos subúrbios e a polícia parisiense. Mais uma vez, nada de novo. Há já bastante tempo que se sabe da situação caótica que se vive nos bairros suburbanos de paris, habitados por famílias de emigrantes africanos e árabes e os seus filhos. A geração que veio para França deparou-se com inúmeras dificuldades, mas é nos seus filhos que encontramos o lado negro da emigração: jovens sem grandes perspectivas de futuro, rejeitados pela sociedade onde têm que viver, incapazes de saber aonde pertencem, quais as suas raízes culturais. O resultado? Deliquência juvenil, vandalismo, extremismos religiosos, desemprego, toxicodependência.
Paris não é a única cidade europeia rodeada por uma autêntica muralha de bairros suburbanos degradados. São locais deprimentes, de uma arquitectura avassaladora e dacdente, onde as ruas desoladas estão ladeadas de bunkers em estados avançados de degradação. Sem esperança, sem cor, sem sonhos. Haverá assim uma tão grande diferença entre Saint-Denis e a Cova da Moura?