terça-feira, 6 de setembro de 2005

Primeiro dia no deserto

Primeiro dia de escola, primeira reunião. Duas ou mais horas, confesso que perdi a conta, tremendamente chatas. Já me tinha esquecido de como na venda do pinheiro se leva a sério o rigor informativo, mas depois de uma hora a anotar decretos-lei, recomendações de acção, sugestões de regimes, orientações de trabalho e outros jargões semelhantes, a minha memória refrescou-se, tal como se tivesse acabado de saborear uma madalena (esta é uma alusão a proust, tenham bem atenção). Claro, começando a ordem de secretários para escreverem as actas por ordem alfabética, imaginem quem é que foi o primeiro... é da praxe. Só que ter ali ao lado quatro ou cinco páginas de gatafunhos manuscritos que terei de transformar num texto com algum sentido parece-me trabalho canino.

E agora, as boas notícias: com quatro turmas de quinto ano, três têm vinte ou vinte e um alunos e a quarta vinte e cinco. A quarta, claro, é a minha direcção de turma. Honestamente, por vezes penso que ando com as palavras director de turma estampadas na testa. Vinte e cinco é, também, precisamente, o número de horas semanais que tenho de aguentar na escola. Vinte e duas lectivas (ou não, logo se vê) e as restantes ao serviço da escola. Só depois de amanhã é que saberei o que isto significa. Tudo isto será potencialmente recompensado por um dia livre. Mas só acredito nele quando tiver com o meu horário na mão.

O cerco aperta-se: logo de manhã, chego à sala de professores, prontinho para fumar o meu cigarrinho da manhã (um ritual importantíssimo para preparar a alma para o embate com os egos dos profes), e sou avisado de que naquela escola não se fuma. Olha que... chatice! Já me via a pôr os dois pés do lado de fora do portão da escola e a largar fumaças, mas a chuva que caía tornava a ideia pouco convidativas, e sendo os cafés das redondezas pouco melhores do que pardieiros, as perspectivas matinais pareceram-me pouco agradáveis. Mais tarde vim a saber que se pode fumar, sim senhor, mas só em espaço próprio (não, não é a casa de banho). De acordo com o horário do espaço... segundas, terças, quintas e sextas das oito e meia às quatro e meia, às quartas só até ao meio dia. A sala de fumo também serve de sala de reuniões, e não queremos que as almas não fumadoras seja perturbadas pelas emanações dos cigarros.

Claro que a venda do pinheiro continua o mesmo pardieiro de sempre. Terra de prédios de estilo tipicamente vivenda saloia, onde a noção de ordenamento nem sequer começa a ser sonhada. Trânsito infernal. Ruas apertadas ladeadas de carros. Paredes cinzentas de fumo dos escapes. Que fim do mundo!