quarta-feira, 17 de agosto de 2005
Maré Baixa
Por hoje, só imagens, que é o que eu arranjo quando não tenho quer tempo, quer paciência, quer imaginação para arranjar assuntos, matutar sobre eles e escrever.
Primeiro, o meu último desenho. Mais uma variação a preto e branco sobre as formas que se obtém fazendo as linhas passear, como dizia kandisnky ou klee, já não me recordo. Claro, eu deixo as linhas passear, mas não vão muito longe. Mal me apercebo, brando o chicote que é a minha caneta e moldo-as à força, linha sobre linha, em formas abstractas proto-tridimensionais cuja organização final obedece a uma lógica interna que não é imediatamente aparente naquele primeiro momento em que a ponta da caneta toca o papel.
Segundo, uma foto da praia do forte na maré baixa. Sei perfeitamente que não se vê o forte da Ericeira, o mar, o areal e a baía de ribeira de ilhas. Mas vê-se o que eu considero de mais fascinante nesta vida à beira-mar: os buracos e interstícios por entre as rochas, habitualmente cobertos pelo mar mas revelados na maré baixa. Pequenos mundos fascinantes, a fervilhar de vida e cor. Pequenos ecossistemas secretos, que são o local onde o mar verdadeiramente começa, naquela zona indefinida entre o mar e a terra.
Olhem com atenção para as rochas à beira mar durante a maré baixa, e fascinem-se. Verão paisagens verdadeiramente exóticas, e seres de formas mais espantosas do que as de quaisquer seres extraterrestres. Minúsculos cadinhos de vida fervilhante, tão perto de nós, cidades microscópicas habitadas pelas criaturas estranhas que compõem a vida marinha.
Eu não me canso de olhar. Algas, nudibrânquios, caracois do mar, ouriços do mar, lapas e mexilhões, por entre os surreais nichos e reentrâncias rochosas, cobertos por espelhos de àgua límpida e transparente. A beleza, por vezes, encontra-se mesmo debaixo dos nossos olhos. Há apenas que saber olhar.