domingo, 20 de março de 2005

Mortes Desnecessárias

No Público

Fui acordado hoje por uma revoltante notícia vinda dos desertos morais que rodeiam a minha lisboa. Dois agentes da PSP foram mortos ao responderem a uma ocorrência num bar da amadora. É uma notícia que me deixa profundamente revoltado - dois agentes, a fazer o seu trabalho, mortos. Duas mortes desnecessárias e revoltantes, de uma violência inusitada e inesperada. A notícia da morte dos agentes é uma notícia que enfurece, pois trata-se da morte inglória de dois homens que estavam apenas a fazer o seu trabalho. Súbita, violenta e inesperada. Sem sentido. Mais duas famílias que ficam perdidas, a perguntar-se porquê. Porque é que não voltam a ver os seus filhos, os seus amigos, que se dedicaram ao serviço de todos nós sem imaginar que essa dedicação lhes traria a sua morte prematura?

Porquê?

Ao ouvir a notícia, apeteceu-me que este país fosse menos democrático, apeteceu-me que fosse decretada alguma forma de lei marcial e que fosse limpo o lixo humano que pulula nos infectos subúrbios de lisboa. É cada vez mais deprimente ver o que se acumula nas periferias - a violência inútil, o alastrar da toxicodepêndencia, o crime omnipresente, toda esta fétida humanidade que parece insistir em viver num esgoto social, atolada no pântano da pobreza e da criminalidade.

O meu respeito vai para quem, como os dois agentes assassinados, dedica a sua vida a tentar melhorar esta sociedade. Todos nós, polícias, assistentes sociais, médicos, enfermeiros, professores, tentamos dar a nossa contribuição, fazer a nossa parte para que o futuro seja um pouco melhor. Estamos na linha da frente, corremos riscos. Mas o risco de suportar um pai ou mãe irresponsável que é complectamente desleixado com uma criança, preferindo acusar professores e assistentes sociais de incompetência por não resolverem os problemas que a irresponsabilidade destes pais não deseja ver resolvidos, é de longe muito inferior ao risco de morrer por ajudar a manter as nossas ruas mais seguras.

Não sou particularmente defensor de penas de morte e ideologias assim, mas perante esta notícia o raciocínio liberal fica um pouco esquecido pela visceralidade da violência. Dá vontade de responder à letra, de devolver ferro com ferro e fogo com fogo. A verdade é que duas vidas se perderam. Duas vidas de sonhos, esperanças, alegrias e desejos. E em troca do quê? Alguma indignação nos media, compensações financeiras que tardam, muitas vezes, a chegar. E o assassino, esse, continua a sua vida, uma vida pouco útil, à margem da sociedade, uma vida que em nada contribui. Uma erva daninha que estrangulou duas vidas desnecessáriamente. É impossivel ficar frio e indiferente perante este acontecimento.

Os irmãos e o pai da minha namorada são agentes da Polícia. Ao ouvir a notícia passada na amadora, o meu coração saltou - um dos irmãos está a chefiar uma esquadra nas proximidades, na cova da moura (outro esgoto infecto de humanidade desperdiçada). É também por isso que uma notícia destas choca - poderia ter acontecido a um familiar. Mas não deveria ter acontecido, não deveria acontecer a ninguém.

O que estará a acontecer a este país? Porque é que toleramos estas baixezas sociais, porque é que deixamos que se acumulem nas periferias indivíduos sem escrúpulos que se dedicam apenas a estragar aquilo que todos nós tentamos construir - uma sociedade mais justa, mais culta, um futuro melhor?