terça-feira, 30 de abril de 2024

Cidade Proibida


Eduardo Pitta (2007). Cidade Proibida. Lisboa: Quidnovi.

Uma leitura intranquila, difícil de categorizar. Por um lado, lê-se como uma crónica da alta sociedade portuguesa, de prosperidade assegurada pelo seu nepotismo e redes de influência, onde o mérito se mede pelo status, e é fundamental o respeito por convenções que todos, secretamente mas num secretismo mal disfarçado, desrespeitam. Um mundo de aparências e dinheiro, que vive entre festas e casas de luxo, entretecendo as suas redes de influência e laços sociais, estanque perante quem não pertença ao meio.

Mas é, também, uma história de desamor entre o filho de uma dessas altas famílias, que se imagina diferente embora na verdade mantenha todos os vícios sociais e hábitos enraizados, e um inglês da working class que vive em Portugal como professor ao serviço de uma instituição cultural britânica. Um amor condenado, entre as convenções do português e os traumas do passado de um inglês que topou à légua o desdém social classista.

De um lado, a crónica desapiedada, de um queirosianismo ao estilo da viragem do século XX, de uma fatia da alta sociedade. De outro, a tempestuosidade tórrida e algo hedonista das relações entre amantes. A escrita surpreende pela sua frieza quase clínica, a acção trágica desenrola-se com uma perene inevitabilidade, e todas as personagens vivem para si, para os seus prazeres, estatuto e forma de vida. Nem nos amores a história aquece, há um profundo sentimento de descartabilidade, mesmo que o amor seja forte, a pessoa amada poder ser facilmente abandonada porque haverá sempre mais para ocupar o lugar na capa. Uma leitura incómoda e desapiedada.