quinta-feira, 31 de maio de 2007

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Terrarium. Ainda haverá versões mais kitsch da coisa...

Leituras

Guardian | Dirty money flows distort our economy and corrupt democracy Os paraísos fiscais offshore, coqueluches adoradas dos financeiros e homens do dinheiro, são verdadeiros sorvedouros de receitas fiscais. A linha é muito ténue, entre o fugir aos impostos e evitar os impostos. Na realidade, os estados ficam com muito menos dinheiro para aplicarem em programas sociais, de saúde e educação, mas também, neste nosso mundo em que a filosofia neoliberal impera, quem é que se interessa por programas sociais, de saúde e educação? O lucro, meus caros, o lucro puro e duro, é esse o objectivo.

Guardian | Norway rated world's most peaceful countryRankings, rankings... desta vez, o ranking dos países mais pacíficos. Nos lugares cimeiros, sem grande surpresa, encontram-se os herdeiros dos valentes vikings - os países escandinavos. Países como o Iraque ou os EUA encontram-se nos últimos lugares... i wonder why. Portugal? Um nono lugar nesta notícia típica de fait-divers.

quarta-feira, 30 de maio de 2007

Leituras

BBC | Russia tests long-range missile Uma notícia saída dos velhos tempos da guerra fria. Pressionada pelo escudo anti-míssil americano, o governo russo testou um novíssimo ICBM capaz de ser armado com dez ogivas e de evadir defesas anti-míssil. O teste teve lugar em Plesetsk, cosmódromo e base militar russa, com o míssil a ser disparado com sucesso até Vladivostok, a uma distância de mais de 5000 km.

The New York Times | Digital fears emerge after data siege in Estonia Após o derrube de estátuas que comemoravam a vitória soviética frente aos nazis, a Estónia sofreu aquele que foi o maior ciberataque até agora registado. Os sistemas informáticos públicos e privados estónios sofreram um violento ataque de DOS, com provável origem russa. A questão que se coloca é esta: onde acontecerá a seguir? É o pensamento basilar por detrás de mais uma paranóica corrida às armas, desta vez às ciber-armas.

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Regresso aos foguetões. Porque simbolizam a esperança no futuro. Para além da imaginação, para lá deste poço de gravidade verdejante a orbitar nos vastos oceanos intergalácticos.

terça-feira, 29 de maio de 2007

Leituras

BBC | Designing mobiles for the world Olhamos para o telemóvel como um objecto de tecnologia pura, e imaginamos que quem os desenha pensa apenas em colocar no mercado produtos de cada vez mais alta tecnologia. Mas por detrás da engenharia está a sociologia e o design, que se preocupam com os modos de utilização do telemóvel. Num mercado saturado, são estes os factores que destacam um telemóvel de entre tantos. Entrevista da BBC com Jan Chipcase, pesquisador-chefe de impactos sociais do telemóvel na Nokia, que investiga um pouco por todo o mundo correntes culturais que poderão originar novos produtos em prazos que se medem de meses a décadas.

El Mundo | El petróleo biológico e renovable de Alicante Mesmo aqui ao lado trabalha-se num inovador projecto de biotecnologia, que visa sintetizar hidrocarbonentos a partir do cultivo de algas.

Guardian | Japanese minister commits suicide Indiciado num escândalo de desvio de fundos, o ministro da agricultura japonês suicidou-se. Se fosse em portugal, não só estaria vivo e a clamar inocência na praça pública, como certamente que seria candidato a alguma câmara deste país, com hipóteses quase certas de vencer as eleições. Pelos vistos, no Japão ainda vigoram os códigos de honra pessoal (coisa que em portugal sempre foi inexistente).

The New York Times | A programming language like playing with blocks O New York Times dá destaque ao Scratch, o projecto do MIT que pretende simplificar a aprendizagem de programação com um ambiente simples e intuitivo. Confesso, no entanto, que ainda não consegui dar a volta à coisa... algo que tem de ser feito, uma vez que no próximo ano lectivo pretendo usar o Scratch nas minhas aulas (que não são de TIC, são de Educação Visual e Tecnológica - 2º ciclo).

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Nada de novo, fim de semana sem tempo para desenhar. Revisitação de velhas ideias.

segunda-feira, 28 de maio de 2007

Babel 17

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Samuel R. Delany, Babel 17, Millenium Books, 1999

Babel 17
Wikipedia | Samuel R. Delany

Os anos 60 do século XX foram uma época muito especial no domínio da FC. Foi nessa década que a FC se libertou dos paradigmas da aventura simplista no espaço, com um grupo de influentes autores que explorou novos campos para a FC, experimentando abertamente e tentando ir muito mais além do que o tentado anteriormente. Até aos anos 60, FC era sinónimo de aventura espacial, com muito raio laser e alienígenas verdes à mistura. Após os anos 60, a FC tornou-se sinónimo de imaginação pura, com autores a utilizarem os elementos estilísticos da FC para reflectirem profundamente o mundo em que viviam, não hesitando em subverter a própria estrutura da FC na eterna busca do que está mais além. Foi esta a época que nos legou autores como Michael Moorcock, Brian Aldiss e J. G. Ballard, sem esquecer Samuel R. Delany. Foi também a época do apogeu da Space Opera.

Originalmente publicado em 1967, Babel 17 segue as aventuras de Rydra Wong, exploradora espacial, comandante de nave e poetisa, dotada de uma estranha forma de empatia que é uma forma de telepatia. Num cenário de guerra interestelar, com a humanidade a combater uma guerra civil através da vastidão das galáxias, Rydra é contactada pelas altas patentes militares terrestres para tentar decifrar um código impenetrável, apelidado de Babel-17. As capacidades únicas de Rydra depressa a levam a compreender que não está perante um código, mas sim perante uma língua artifical, extremamente compacta e sintética, que altera a estrutura cerebral, a percepção e o modo de pensar de quem a fala. Rydra faz-se acompanhar de uma tripulação de marinheiros espaciais, para ir até à linha da frente da guerra intergaláctica, acabando por descobrir o segredo por detrás da língua, e encontrar uma forma de acabar com a guerra.

There are certain ideas wich we have words for them. If you don't know the words, you can't know the ideas.

O tema da língua como tecnologia alicerça-se numa teoria linguística tornada obsoleta pela gramática generativa proposta por Noam Chomsky. Conhecida como hipóteste de de Sapir-Whorf (não é esse Worff, o oficial Klingon da Enterprise), baseia-se na ideia que há uma relação entre a estrutura gramatical da língua que é falada com a forma de pensar e interpretar o mundo, ou seja, que a natureza de uma língua influencia a maneira de ver o mundo daqueles que a falam. Babel 17 leva ao exagero esta teoria: quando Rydra Wong pensa em Babel-17, o próprio tempo parece desacelarar, as acções rapidissimas de segundos arrastam-se lentamente na sua percepção. Babel 17 é uma exploração fascinante de um conceito científico obsoleto. A ideia de linguística como tecnologia pode parecer estranha, mas Samuel R. Delany é professor de literatura e, por isso, bem familiarizado com teorias linguísticas.

Por interessante que seja a hipótese linguística, o valor de Babel 17 está no universo exótico e futurista, traçado a pinceladas largas por um autor que valorizou os aspecto culturais do futuro imaginado sobre a fria tecnologia.

Como space opera que é, Babel 17 é uma obra maior do que si própria, um voo de imaginação que não se contém nos limites das páginas do livro. É uma obra que obriga a nossa imaginação a preencher os vazios, a pegar nas dicas e pistas deixadas pelo autor e construir a percepção de um mundo vasto, imaginário, de um futuro ao mesmo tempo longínquo e exótico. Samuel R. Delany está no extremo oposto da frieza científica de um Arthur C. Clarke. O seu futuro imaginado é exótico, estranho, colorido, surreal, e sempre muito vasto. Pensem nas descrições científicas das estrelas e galáxias. Agora pensem nas imagens arrebatadoras captadas pelo telescópio Hubble. A prosa de Delany segue precisamente esse sentimento de encanto arrebatador, quase barroco na sua construção. A humanidade de Babel 17 não se coíbe de se transformar a seu bel-prazer, incorporando físicamente os seus mais estranhos seres imaginárips. De facto, nesta obra a definição de humano é algo muito difuso. Numa era em que a modificação genética é banal, qualquer um modifica o seu corpo a seu bel-prazer.

Babel 17 é uma obra clássica, que com o passar dos anos não perdeu a sua acutilância e sentido do maravilhoso.

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Abstracção com dentes. Picante. CB Model Pro + Bryce.

Maio, vinte e oito

Outros tempos houve em que hoje seria feriado, dia de folga nacional com direito a discursos de prosa inflamada e paradas. Porquê? Era a data em que se comemorava o golpe militar que veio a dar origem ao Estado Novo. Foi a 28 de maio de 1926 que um grupo de generais depôs o governo democrático e criou as bases para a ditadura retrógrada, obscura e parola que dominou o país até 1974. 28 de maio é um belíssimo dia para reflectir em muitas das razões pelas quais somos um país atrasado e pouco desenvolvido. Os trinta anos sobre o 25 de abril têm modificado profundamente o país, mas o atraso de mentalidades ainda perdura. A herança de Deus, pátria, família ainda pesa sobre o espírito nacional.

É uma data que não devemos esquecer. É a data em que se deveria comemorar a memória dos cinquenta anos de obscurantismo fascista. Porque quem esqueçe a história está condenado a repetir os erros do passado.

sábado, 26 de maio de 2007

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Abstracção. Bryce 5, apenas planos de nevoeiro e pontos de luz, sem qualquer trabalho de processamento noutros programas. Criar, renderizar e já está.

Leituras

Guardian | Don't take it personally Parecemos viver no pior dos tempos. As convergências propiciadas pelas tecnologias digitais estão efectivamente a abolir a privacidade. Na nossa vida online, a vigilância é contínua - não uma vigilância activa mas uma vigilância passiva, baseada em software capaz de registar os nossos passos e as nossas preferências. É um dos pilares do comércio electrónico - a capacidade de pesquisar bases de dados para fornecer recomendações de compra baseados nas preferências aparentes do consumidor individual. Será um atentado às liberdades e garantias? Em regimes totalitários, sim. Certamente que este tipo de tecnologia faz parte dos sonhos molhados de qualquer tiranete que se preze. Nas sociedades democráticas, o perigo está em ficarmos demasiado enfeitiçados pela Vénus do consumo. Há formas de usar estas tecnologias com fins mais obscuros - já há departamentos de recursos humanos que avaliam os candidatos não só pelos seus currículos, mas também pelos seus blogs e páginas pessoais, o que é uma grosseira violação de privacidade. Há relatos de políticas específicas que rejeitam candidatos a empregos porque apesar do currículo ser aceitável o candidato deixou no seu blog ou página de perfil de site social uma fotografia de uma festa em que estava de copo na mão, ou uma opinião divergente da norma, ou alguma preferência pessoal que não agradou aos responsáveis da empresa. Isto sim, é uma ideia verdadeiramente assustadora: a de que a dedicação ao trabalho e à empresa deve ultrapassar tudo, sobrepondo-se mesmo ao próprio espírito e vida pessoal do trabalhador. Uma espécie de dedicação sacerdotal. Embora isto possa acontecer, e aconteça, nas sociedades democráticas pode-se e deve-se combater estas utilizações nefastas das tecnologias. No entanto, não deixa de ser angustiante saber que a nossa privacidade, frente à internet, simplesmente se vaporizou.

Guardian | North Korea tests missiles in Sea of Japan A Coreia do Norte mostrou mais uma vez as suas garras com um novo teste de mísseis potêncialmente nucleares. A política paranóica e militarista da Coreia do Norte está a ter consequências para além das habitualmente relatadas pelo jornalismo simplório dos telejornais. O Japão, após a profunda derrota na II Guerra, abandonou como país o militarismo, relegando as suas forças militares ao estatuto de força de auto-defesa (força bem preparada e equipada, mas que apenas pode intervir em defesa do território japonês) e proibindo constitucionalmente a agressão militar e o uso de armas nucleares - sabendo-se, como se sabe, que o Japão é o único país na história que sentiu na pele o horror das armas atómicas. Mas as agitações norte-coreanas estão a atemorizar o país. O governo japonês tem criado políticas mais agressivas para as forças de defesa, e discute-se sériamente a alteração da constituição nipónica para remover a proibição de armas nucleares, o que permitiria ao Japão tornar-se uma potência nuclear. Para perceberem o potêncial desestabilizador destes acontecimentos, imaginem que a Alemanha, com o seu historial e o seu passado nazi, sentia-se ameaçada por um país vizinho e começava activamente a rearmar-se e a discutir a possibilidade de desenvolver armas nucleares.

Manhã dos Mongolóides Já que se fala nas Coreias, no âmbito da Lisboa 20 Arte Contemporânea, um projecto de arte digital dos artistas coreanos Young-Hae Chang Heavy Industries. O que é que aconteceria se após uma noite de bebedeira em Lisboa se acordasse... em Seul como um coreano? Citando a frase incial, Porque estao as minhas bochechas tão redondas? Via We Make Money Not Art.

The New York Times | More than ever, it pays to be the top executive É o aspecto mais escandaloso da nossa sociedade economicista e capitalista. É legítimo que quem tenha maiores responsabilidades ganhe mais do que quem tem menores; é legítimo que os gestores ganhem mais do que os seus funcionários. Mas essa legitimidade está a ser esticada para lá dos limites, graças à cupidez dos amantes da mão invisível do mercado. O fosso salarial entre o topo e a base já é abismal. Enquanto os trabalhadores de base ganham salários de centenas, os de topo ganham salários de milhões, justificados apenas pelas suas responsabilidades. Note-se que isto passa-se no mundo que adora as ideias de eficiência económica, das deslocalizações e reduções de pessoal para aumento dos lucros. Há um toque de violenta hipocrisia nos evangelistas do mercado livre.

Gimp Talk Tutoriais para o Gimp, esse programa a que não consigo dar a volta....

Vénus do consumo: esta, meus senhores, é uma referência a Alan Moore que vos desafio a encontrar. Dou duas pistas: Venus of the hardsell e comics. As respostas correctas ao desafio terão como prémio um elogio à profundidade da vossa cultura pop.

sexta-feira, 25 de maio de 2007

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R is for Rocket... sempre em direcção ao futuro.

Leituras

BBC | Third of bloggers risk the sack Alguns dos bloggers convictos não se coíbem de colocar online resmungos sobre os seus locais de trabalho, ou dados confidenciais. Esquecem-se apenas de anonimzar, ou de escrever sob pesudónimos... e depois surpreendem-se com as consequências das suas palavras.

The New York Times | Snubbed by US, China finds new space partners A China está a mostrar uma estratégia concertada para conquistar uma posição no competitivo e lucrativo negócio espacial. Incapaz de se juntar aos grandes, especialmente à NASA, a China oferece o seu know-how aeroespacial a países do terceiro mundo, semeando as sementes de uma futura presença nos mercados mundiais.

Motel de Moka | Asian Vintage Este já anda no meu disco rígido há uns dias. Para os amantes da música bizarra ou simplesmente estranha, o blog ultra-cool Motel de Moka colocou online canções pop chinesas, vietnamitas e taiwanesas dos anos 60. Uma delícia aural.

quinta-feira, 24 de maio de 2007

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Casinha. Se tudo me correr mal na vida, construo uma destas ao pé de uma lagoa e vou para lá viver, eremita.

Expressão Livre

Acredita o meu bom amigo que algo neste país está a mudar e que a liberdade de expressão já não é o que era. Bem, se assim é, está na hora do finca pé, de ir à luta e correr riscos, em nome da defesa das nossas liberdades fundamentais. Coisa fácil de dizer para quem não tem três simpáticos filhos para alimentar, eu sei. Mas tem de ser. É a velha história, sublinhada pela conhecida citação de Edmund Burke, que nos diz que all that is necessary for the triumph of evil is that good men do nothing.. A razão pela qual os homens de bem se deixam estar quietos enquanto as forças opressivas manobram é precisamente a normalidade, a necessidade de ter um emprego e de providenciar as necessidades básicas à família, como o sublinhou Gitta Sereny no livro No Mundo das Trevas, em que entrevistou Franz Stangl, um austríaco que se tornou comandante do campo de concentração/extermínio de Treblinka. A história de Stangl é sintomática: longe de ser um nazi convicto (pelo menos, a acreditar na obra), Stangl era apenas um oficial de polícia austríaco que aquando do Anschluss decidiu colaborar com os nazis - porque não queria perder o seu emprego. Transformou-se, de forma quase imperceptível, de plácido polícia austríaco em sinistro carrasco de campo de concentração. Como este, há muitos outros homens, bons ou nem por isso, que se deixam levar, não fincando pé quando é necessário, simplesmente porque precisam do emprego, do dinheiro, da posição.

Apesar de me considerar homem bom, não deixo de temer pela minha profissão. É algo que ultrapassa a mera recompensa financeira para fazer face aos gastos do dia a dia (cada vez menor recompensa para cada vez mais altos gastos). É algo que tem a ver com a realização profissional e com o encontrar de um sentido para a minha vida através da profissão que exerço.

A estória do professor suspenso da DREN por causa das piadas ou frases sobre o nosso distinto senhor primeiro ministro (sim, escrevo isto com toda a ironia) anda no ar, levantando poeiras que muitos interpretam como um inusitado ataque à liberdade de expressão e que o meu amigo intrepeta como um sinal dos tempos que se aproximam. Eu não interpreto a coisa bem assim. Vejo neste fait divers um sintoma típico do lado mais obscuro da profissão docente.

Nem todos somos assim. A esmagadora maioria dos professores são profissionais competentes e esforçados que tentam ao máximo dar o seu melhor pelos seus alunos, criando novas experiências de aprendizagem e tentanto sobreviver num sistema educativo de um país que não sabe o que quer para o seu sistema educativo e que anda ao sabor de modas passageiras, debitadas dos suaves lábios de algumas almas iluminadas, pseudo-intelectuais que leram algures alguma coisa que acharam interessante e vai disto, agora todo o sistema tem ser assim, assado, cozido ou frito. Em dez anos que já levo de ensino já perdi a conta às teorias emanadas dos píncaros das torres de marfim. Sei que não é esta a imagem do professor que passa "lá fora", na comunicação social e na sociedade. Mas é assim que somos.

Infelizmente, também há uma pequena minoria, infelizmente influente, que disfarça a sua falta de competência em intriguice, inveja, maldade pura. São poucos, mas existem, e parece que vivem para prejudicar os outros - quer colegas quer alunos. São useiros e vezeiros em interpretar leis e em tentar atravancar aqueles que tiveram o azar de se atravessarem na sua mira. Parece-me que o caso da "falta de liberdade de expressão" é um típico caso destes que extravasou para os media.

Confessem lá: quantos de nós, especialmente funcionários públicos, é que não amaldiçoaram o primeiro ministro e as suas políticas? E quantos de nós é que não olharam para o país em que vivemos, para a nossa luta para melhorar este país, e, desolados e desanimados pela ignorância alastrante, pelo lodaçal nacional, não amaldiçoámos a nossa terra-mãe? Não quero aqui falar em pátria, não estou com paciência para ser conotado com a emergente (e aberrante) extrema direita.

Não é algo exclusivo à profissão docente. Certamente que outras profissões também têm os seus tiranetes de gabinete, os seus napoleões de vão de escada, os seus adolfos da reunião, os reis absolutos do seu pequeno império. É algo que infelizmente faz parte da condição humana.

O que é que realmente me angustia? Com este novo modelo de avaliação do desempenho dos funcionários públicos, quem é que irá avaliar? O profissional isento e competente, ou o tiranete do gabinete? Temo que em muitos casos o segundo prevaleça sobre os primeiros.

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Antes que fiquem a pensar que operei um milagre no 3D, passando horas a trabalhar afincadamente no barco, deixem-me dizer-vos que aí, pela vasta internet, encontram-se milhares de modelos 3D partilhados. É só descarregar e importar para o vosso programa 3D favorito. Uma imagem plácida, para este dia cinzento.

Leituras

BBC | UN troops 'traded gold for guns' Capacetes azuis paquistaneses envolveram-se em negócios de troca de armas por ouro com as milícias congolesas que supostamente deveriam desarmar. O caso já não é novo, mas a ONU suprimiu o relatório para não ferir as susceptibilidades do governo do Paquistão - país que é o que mais tropas contribui para as missões de paz das Nações Unidas.

Guardian | Adopt your own Italian vineyard - and claim a year's supply Seja generoso. Adopte uma... vinha. A associação de vitivinicultores de Roma e arredores lancou esta curiosa iniciativa. A partir de 500 euros, pode-se "adoptar" uma das pequenas explorações romanas, garantindo a reserva de um ano de vinho. Os vitivinicultores até garantem que quem adoptar terá uma palavra a dizer sobre as características da produção. Agora, se a moda pega... imagine-se adoptar um bananal, ou um pomar... ideia poética para iniciar o dia.

TSF | É prematuro concluir que operações de Multibanco passem a ser pagas com SEPA A uniformização do sistema multibanco ao nível europeu pode finalmente abrir a porta ao velho sonho da SIBS: taxar as operações efectuadas no multibanco. Entretanto, responsáveis da SIBS já vieram a público tranquilizar, reiterando que não há aumentos previstos. Mas com liberalizações é sempre de desconfiar. O problema é que, como se sabe, a mão invisível do mercado é sempre lesta e eficiente a levar proveitos ao seu bolso, também pouco visível.

quarta-feira, 23 de maio de 2007

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Scherzo em tom alienígena com acordes aeroespaciais.

Leituras

BBC | '$100 laptop' sparks war of words O OLPC ameaça os "poderes" instituídos dos gigantes da informática. Agora, num momento crucial para a sua divulgação, o OLPC enfrenta a concorrência de um pc intel vendido abaixo do preço de custo. Uma tentativa de aniquilar o OLPC? Algo mais prosaico: o projecto do MIT tem por base chips da AMD, a grande rival da intel

Guardian | Safety first on the shelves Se a internet revolucionou o mundo da música - não no que diz respeito à pirataria mas sim na proliferação de música nova que via internet chega a novos públicos, livre de intermdiários, o mesmo não se pode dizer dos livros. Apesar da profusão de blogs e páginas pessoais, os editores vão apostando nos autores tradicionais. As experiências com novas formas de publicar (licenças creative commons, por exemplo) são pontuais. Compreende-se: um músico pode disponibilizar online o seu trabalho de forma gratuita, ampliando a sua audiência e cativando novos públicos para os seus concertos. Já um escritor não pode fazer o mesmo.

Guardian | Iran's secret plan for summer offensive to force US out of Iraq Manobras propagandistas destinadas a justificar mais um aventureirismo militar americano ou uma observação do lado mais tenebroso das peças que se movem no mortífero tabuleiro iraquiano?

The New York Times | Top Directors See the Future, and They Say It’s in 3-D Relegado durante anos à condição de curiosidade cinematográfica, o cinema 3D está a ganhar novo fôlego graças à tecnologia. Os grandes estúdios e alguns dos melhores realizadores de Hollywood estão a anunciar projectos que tiram partido da ilusão de percepção de profundidade com tecnologia muito mais avançada do que aquela que nos legou clássicos camp como The Creature of the Black Lagoon.

terça-feira, 22 de maio de 2007

... Parte 2



Porque me apetece, porque estou talvez um pouco entediado - hoje é do dia das famosas provas de aflição, digo, aferição, e se a manhã é lenta, a tarde será pesadíssima com o processamento dos dados. Mas pior do que eu estão os professores correctores, de do 1º Ciclo, Língua Portuguesa e Matemática, que no final do ano lectivo acumulam as avaliações das suas turmas com a correcção das tais provas. Enfim, estamos em portugal, país com p de mentalidade pequenina.

Leituras

BBC | China buys $3bn Blackstone stake O que é que esta notícia tem de especial? É paradoxal. O estado chinês, formalmente comunista, comprou uma parte de uma gigantesca empresa financeira. Até os comunistas se estão a trasformar em capitalistas... o que não é nenhuma novidade, bem sei.

Guardian | Oh yes, he's got an agenda O novo filme de Michael Moore, Sicko, às voltas com o inexistente sistema de saúde americano, já está agitar àguas e a causar controvérsias - precisamente o objectivo deste realizador de documentários agit-prop. Na eterna comparação entre sistemas, a europa ocidental surge como o modelo de sistemas de saúde que Moore considera que a américa deveria ter. Algo que dá que pensar, agora que temos governos apostados em desmontar os sistemas públicos de saúde em favor de um sistema privatizado, mais à americana.

Guardian | US builds fortress embassy in Iraq Festung Amerika: a futura embaixada americana em Bagdad fará envergonhar qualquer fortaleza medieval que se preze. E eles ainda insistem que estão a vencer. Conselho do jornalista: construam a embaixada com telhados largos, para que os helicópteros consigam evacuar o pessoal da embaixada mais rapidamente.

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Esfera em verde.

segunda-feira, 21 de maio de 2007

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Impressão.

Leituras

Guardian | The power of zombie films Grand guignol, exagerado, absurdo, o cinema apocalíptico faz-nos confrontar os nossos medos civilizacionais, o medo da nossa queda, seja porque meios. E repito: o melhor cinema de zombies contém metáforas que tão bem nos caracterizam - como a cena clássica dos mortos-vivos a arrastarem-se sem sentido pelos corredores iluminados do centro comercial em Dawn of the Dead, a loucura químicamente induzida de 28 Days ou a tirania do poder absoluto apoiado em élites de Land of the Dead.

Guardian | 'Welcome to Tehran' - how Iran took control of Basra Reportagem aterradora de Baçorá, cidade sob "protecção" britânica que não ocupa tantas manchetes como Bagdad, mas onde o sectarismo e a influência iraniana substituíram a legalidade - se é que há alguma legalidade num país sob ocupação.

The New York Times | Reaping results: data-mining goes mainstream As tecnologias digitais permitem criar ferramentas capazes de fazer emergir padrões com sentido a partir de uma imensa míriade de dados aparentemente incorrelacionáveis. As aplicações são mais que muitas, desde maior eficiência na prestação de serviços até ao policiamento mais eficaz.

No Fear of the Future | An alternate history of chinese science fiction Tem andado a correr os sites e blogs do costume, e só ainda não foi aqui retransmitido por falta de tempo. Um texto hilariante, uma brilhante ucronia que reconta a história da FC... virando as mesas, retirando os tapetes, colocando a China como o centro cultural do mundo, cujas correntes literárias determinam padrões mundiais. É também divertido tentar perceber as private jokes nos nomes ficcionados de inexistente autores chineses que escreveram clássicos como Suchen The Conqueror (demorei a perceber o clássico Robur de Verne), A Princess of Mars ou Liu Hui Wen, autor de The Call of Cthulhu. Esta ucronia também não poupa os autores contemporâneos.

Eurico, o Presbítero

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Alexandre Herculano, Eurico, o Presbítero, Círculo de Leitores, 1986

Wikipédia | Alexandre Herculano
Eurico, o Presbítero
Projecto Vercial | Eurico, o Presbítero

O sibilar das rajadas também cessou completamente. Parado sobre a face da terra, o ar era semelhante ao lençol do finado a quem recalcaram a gleba que o cobre, frio, úmido, pesado, sem ranger, sem o movimento, cosido sobre o peito, onde acabou o bater do coração e o arfar compassado dos pulmões.
Então, muito ao longe, uma vermelhidão tenuíssima foi avultando pouco a pouco, derramando-se pelo horizonte e repintando a abóbada imensa dos céus.
Depois, esse clarão sinistro reverberou na terra: as cimas agudas, dentadas, tortuosas, alvacentas das fragas marinhas tinham-se abatido e livelado, como os cerros informes de neve amontoada, que, derretidos nos primeiros dias do estio, vão, despenhando-se, formar um lago chão e morto na caldeira mais funda do vale fechado.
Tudo a meus pés era um plano uniforme, ermo, afogueado, como a atmosfera que pesava em cima dele: e, além, jazia o cadáver do mar.
Eu, o Silêncio e a Solidão éramos quem estava aí!


Alexandre Herculano foi uma das figuras maiores do século XIX português. Escritor e historiador, Herculano também se distingiu pela sua participação nas convulsões políticas da atribulada primeira metade do século XIX. Como romancista, Herculano legou-nos o romantismo, corrente literária que galvanizou a europa do século XIX e que Herculano introduziu em Portugal através dos seus romances históricos. Como historiador, o romance histórico seria uma extensão lógica, e os seus romances distinguem-se quer pelo seu rigor histórico (dependente dos conhecimentos da época) quer pelo seu carácter profundamente medievalista. Herculano buscava as raízes da portugalidade, procurando a confluência histórica dos primeiros tempos da nação, mitificando-a através da sua prosa rebuscada e hiperbólica, típica do cânone romântico.

- Cristo e avante! - bradaram os godos: e os esquadrões de Roderico precipitaram-se ao encontro dos muçulmanos. São como dois bulcões enovelados, que, em vez de correrem pela atmosfera nas asas da procela, rolam na terra, que parece tremer e vergar debaixo do peso daquela tempestade de homens. O ruído abafado e bem distinto do mover dos dois exércitos vai-se gradualmente confundindo num som único, ao passo que o chão intermédio se embebe debaixo dos pés dos cavalos. Essa distância entre as duas muralhas de ferro estreita-se, estreita-se! É apenas uma faixa tortuosa lançada entre as duas nuvens de pó. Desapareceu! Como o estourar do rolo de mar encapelado, tombando de súbito sobre os alcantis de extensas ribas, as lanças cruzadas ferem quase a um tempo nos escudos, nos arneses, nos capacetes.

Originalmente publicado em 1844.Eurico, o Presbítero é um romance histórico que vai beber a sua inspiração a uma época mais antanha do que a idade média portuguesa. A acção deste romance de perder o fôlego passa-se nos tempos da conquista da península ibérica, com os reinos visigodos que se ergueram após o império romano a cederem perante a força das armas dos exércitos mouros.

Eurico, o Presbítero narra a torturada história de Eurico, presbítero de Carteia, uma pequena aldeia à beira daquele que é hoje conhecido como o penedo de Tárique. Eurico nem sempre foi humilde e angustiado presbítero de paróquia isolada. Noutros tempos, tempos mais gloriosos e luminosos, Eurico fora outrora nobre e corajoso guerreiro ao serviço da coroa visigótica. Apesar de nobre, Eurico era homem de poucas posses, o que o obriga a um amor proibido com Hermengarda, filha da alta nobreza goda. Impedido pelo pai de Hermengarda, o amor de Eurico transforma-o. Abandona a vida da corte e do quartel, a vida da espada, e abraça a vida eclesiástica. Eurico é um presbítero amargurado, que consome a sua dor interior em cânticos poéticos exaltados e em longo passeios pela paisagem selvagem dos rochedos de Gibraltar.

Algo se pressente no ar, os ventos de tempestade levantam-se, uma onda abate-se sobre a Ibéria visigótica. Os exércitos àrabes invadem a península, aliados a facções que disputam a coroa visigótica. No meio deste turbilhão de sangue e chamas, do refulgir das espadas e dos confrontos destruidores entre ferozes exércitos, Eurico pega em armas. Os anos de sacerdócio não lhe haviam apagado o amor pela pátria. Na sua hora de maior perigo, Eurico não se recusa ao combate. Faz a sua aparição na mais decisiva das batalhas, a de Guadalquivir, onde o embate entre àrabes e visigodos culmina numa aterradora derrota que faz cair o reino visigodo. Factos históricos, aprendidos friamente nos bancos da escola, a que Herculano dá o sopro da vida, da grandeza, da traição, da violência e da morta em páginas de prosa grandiosa e apaixonante. Nesta batalha, Eurico é o misterioso cavaleiro negro, capaz de sózinho deter legiões mouras, e que vê desesperado a traição dos seus companheiros fazer cair a pátria pela qual tanto sangue derramou.

Eurico, o Presbítero é um romance desesperado. Séculos após a poeira apagar os traços das sangrentas batalhas, sabemos o que se passou, sabemos da queda dos reinos bárbaros às mãos mouriscas, sabemos das luzes da civilização do Al Andaluz, sabemos da queda desta às mãos dos reinos da reconquista cristã, saída directamente da resistência dos últimos nobres visigodos, refugiados nas altas serranias das astúrias. Eurico é um personagem da época, sublimemente retratado. Com a alma torturada pelo desgosto de amores, Eurico ainda acredita na sua pátria, mas cada novo embate, cada novo passo, trás consigo a derrota e a aniquilação. À boa maneira dos personagens românticos, Eurico trilha o caminho entre a loucura e o desespero, enquanto se ergue contra forças que são vastamente maiores do que a pequenez da sua humanidade.

- Dez anos! ... Sabes tu, Hermengarda, o que é passar dez anos amarrado ao próprio cadáver? Sabes tu o que são mil e mil noites consumidas a espreitar em horizonte ilimitado a estrela polar da esperança e, quando, no fim, os olhos cansados e gastos se vão cerrar na morte, ver essa estrela reluzir um instante e, depois, desfechar do céu nas profundezas do nada? Sabes o que é caminhar sobre silvados pelo caminho da vida e achar ao cabo, em vez do marco miliário onde o peregrino de tréguas aos pés rasgados e sanguentos, a borda de um despenhadeiro, no qual é força precipitar-se? Sabes o que isto é? É minha triste história! Estrela momentânea que me iluminaste, caíste no abismo! Arbusto que me retiveste um instante, a minha mão desfalecida abandonou-te, e eu despenhei-me! Oh, quanto o meu fado foi negro!

Hermengarda, a paixão de Eurico, é capturada por mouros após um tétrico momento, possívelmente a passagem mais perturbadora do romance, numa abadia em que as religiosas preferem a morte ao cativeiro. Eurico oferece-se para a resgatar, e consegue-o, numa operação heróica digna das maiores gestas de cavalaria, que culmina com um exército mouro às portas das serranias asturianas, onde Pelágio, irmão de Hermengarda, lidera a resistência à invasão àrabe (que mais tarde originará a reconquista cristã). Aí, nas profundezas das cavernas da montanha, Eurico revela o seu segredo a Hermengarda, apenas para se deparar com um obstáculo inultrapassável. Qualquer esperança de felicidade é anulada pelo sacerdócio, ao qual Eurico é tão fiel como ao seu amor por Hermengarda e ao seu amor pela pátria. Tolhido, desesperado, Eurico oferece-se à morte num combate desesperado, enquanto Hermengarda enlouquece.

Os sentimentos exacerbados são dominantes nesta obra atravessada por duas correntes profundas de fidelidade - a fidelidade à pátria e a fidelidade à religião, os grandes motores por detrás desta trágica história.

Este é um romance que tem dentro de si todos os ingredientes românticos. Todo o ambiente a oscilar entre o belo e o horrível, toda a exaltação de sentimentos e emoções, as descrições majestosas, que tiram o fôlego ao leitor, os cumes filosóficos de extremos incomensuráveis, o desespero do momento histórico escolhido pelo livro. Toda a prosa acompanha estes sentimentos, tornado Eurico, o Presbítero numa obra empolgante e apaixonante.

Aconselho vivamente a leitura desta obra. Quem não a conhece será certamente surpreendido, especialmente os amantes do fantástico ou do romance histórico, que encontrarão aqui prosa digna das mais empolgantes obras do género, embora em certos momentos com uma profunda erudição que a tornará complexa aos nossos olhos modernos. Não foi por acaso que escolhi deixar aqui tantas citações: queria que a obra falasse por si própria, gostaria que as palavras citadas apaixonassem aqueles que por acaso ou ventura se depararem com este texto e tenham a paciência de o ler até ao fim.

A minha edição é já antiga, uma velha edição do Círculo de Leitores que colige a obra completa de Herculano que li nos velhos tempos em que andava no sétimo ano (quando o meu professor de português da altura descobriu o que é que eu andava a ler admoestou-me que eram obras muito difíceis para a minha idade e que o mais importante era estudar pelo manual. Mandei-o às urtigas, claro, embora não verbalmente, o que naquela altura ainda me teria merecido um valente sopapo). Creio que as Edições Europa América têm algumas edições de obras de Herculano em formato de bolso. Desconheço outras, mas enfim, sou bibliófago, não bibliófilo. Pelo site do projecto gutenberg e na Biblioteca Virtual de língua portuguesa (um belíssimo site brasileiro que faz aquilo que o Vercial não faz - disponibiliza online textos electrónicos de autores lusófonos - o Vercial ainda acredita em CD-ROMs) encontram-se obras de Herculano em vários formatos electrónicos.

Como nota final, não deixo de notar como esta obra poderia dar um belíssimo filme. É um romance cavalheiresco sem elfos e orcs, mas cairia perfeitamente dentro do imaginário cinematográfico à volta do qual rondam filmes como O Senhor dos Aneis, Tróia ou Alexandre - filmes exaltantes, onde as emoções de antanho, quer da antiguidade real ou imaginária, se recontam em imagens apaixonantes. Mas, enfim, estamos em Portugal...

domingo, 20 de maio de 2007

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Dediquei a passada semama a revisitar o fantástico clássico de Alexandre Herculano, Eurico o Presbítero. Aguardem os próximos dias para resenha/observações/opinares convencidos. Este fim de semanam, dediquei-o a revisitar velhos amigos: os contos de Ray Bradbury e o marco na space opera que é Babel 17, de Samuel R. Delany.

Entretanto, vou experimentanto, reciclando abstractos no Bryce no Photoshop, com muitos truques de layers pelo meio.

Leituras

BBC | Tax payers should build Galileo A projectada constelação GPS europeia está com sérios problemas de financiamento - as parcerias empresariais que supostamente iriam suportar boa parte da factura estão muito reticentes em fazer avançar o projecto. Resta a Bruxelas suportar a maior parte dos custos desta infra-estrutura vital, algo que a Comissão Europeia já sinalizou como viável.

BBC | Global net censorship growing Por detrás do termo eufemista "filtragem de conteúdos online" esconde-se um rápido crescimento no número de países de que uma forma ou de outra tentam controlar aquilo que os seus cidadãos fazem na rede. A China, com a sua Great Firewall, é o caso mais flagrante, mas nem de longe o único. Desde os mais mediáticos casos de perseguições a bloggers (como no Egipto ou nas Fiji) a bloqueios estranhos, como a impossibilidade de consultar os mapas do google. A censura à internet assenta em três pilares: razões políticas, razões de segurança e razões de ordem de conduta social.

Correio da Manhã | Petróleo renderá 4 milhões em 8 anos A notícia da pesquisa de petróleo offshore em Portugal é uma daquelas que me dá arrepios. Não por pensar que Portugal se tornará mais um daqueles estados amaldiçoados pela benção do crude (como a Nigéria, o Chade ou o Iraque), onde a promessa de riquezas petrolíferas depressa colapsa debaixo do peso do nepotismo ou da corrupção. Não por pensar em desastres ambientais - as empresas petrolíferas a operar nos países desenvolvidos são cuidadosas. A razão prende-se com o esgotamento dos recursos ambientais graças ao cosnumo desenfreado. Há décadas que se sabe da existência de depósitos de petróleo no território português, embora este seja difícil de extrair e de refinar, caso exista em grandes quantidades, não sendo económicamente viável - o petróleo extraído seria demasiado caro em termos de preço nos mercados. Mas o rápido crescimento do apetite mundial por petróleo, condicionado pelo consumo crescente da China e pelo consumo também crescente dos países ocidentais, o que sublinha o falhanço das políticas ambientais, aumenta a pressão sobre os preços e torna viável a exploração de petróleo em locais remotos ou a exploração de reservas de petróleo até agora economicamente inviáveis - como as areias betuminosas canadianas, as explorações no àrtico profundo, ou os talhões ao largo de Peniche. O que me assusta nesta notícia é ver quão longe estamos de resolver a nossa gravíssima crise ambiental, que nos ameaça como espécie.

Precisa mesmo de um jipe, desculpe, SUV, ou de uma pesada carrinha para levar a filharada à escola, estar parado nos engarrafamentos da auto-estrada, ir ao supermercado ou à padaria comprar pão? Se nos concentrássemos no essencial e nos livrássemos da cangalhada o planeta agradeceria. Troque o SUV ou o carro de grande cilindrada - caro, pesado e imparável bebedor de combustível - por um veículo híbrido ou de motorização de melhor rendimento ambiental. Só não faço isso ao meu velho, digo, clássico, Peugeot 205 XAD, porque enfim, o dinheiro não estica...

sábado, 19 de maio de 2007

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Uma homenagem ao ícone, ao monstro que não é verdadeiramente um monstro, mas sim uma vítima gerada por criadores que se julgavam acima de qualquer julgamento. Uma curiosa metáfora teológica para a humanidade.

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BBC | Chinese writing '8,000 years old' As letras milenares do império celestial. Análises a petroglifos gravados num local arqueológico pré-histórico apontam para que a origem dos caracteres do alfabeto chinês seja mais antiga do que os 4500 anos que até agora se pensavam.

BBC | Estonia hit by 'Moscow cyber war' A polémica na Estónia devida à transladação de um monumento aos mortos russos na II guerra teve uma consequência inesperada: uma ciberguerra, com a infra-estrutura electrónica da Estónia sob ataque cerrado de DoS e spam originários de IPs de servidores russos. Moscovo nega qualquer ciber-ataque, mas a NATO já enviou especialistas para auxiliarem a Estónia. O pais é pioneiro no domínio do eGoverno, o que o torna especialmente vulnerável a este tipo de ataques.

Correio da Manhã | Governo acusado de coacção na greve A estranha proposta governamental de base de dados para controlo estatístico da adesão a greves soa mal. Não é bem proposta... e retirem a estatística, conjuguem com o novo modelo de avaliação da função pública, e estão presentes todos os elementos para intimidarem os funcionários a não aderirem a greves, temendo futuras repercussões nas avaliações. Não chegava o velho sistema de sindicatos 80% governo 20% com uma concordância final por volta dos 50% de adesão?

Portugal Diário | Descoberto "bunker" subterrâneo nazi Berlim, Alexanderplatz: obras de remodelação urbana puseram a descoberto um bunker esquecido da II guerra mundial. É uma daquelas notícias que nos deixam a imaginar obscuros segredos ocultos durante décadas nas trevas profundas.

sexta-feira, 18 de maio de 2007

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Experiências com planos de nevoeiro, luzes e atmosferas.

Vou voltar à carga: já leram a NOVA e deitaram um olho aos Pequenos Artistas?

quinta-feira, 17 de maio de 2007

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Shores of infinity.

Mal me apercebi que hoje é feriado, quinta-feira da espiga. Enfim, benditos ritos de fertilidade pré-cristianismo adaptados como tradições religiosas pelos missionários que converteram a ibéria. Certamente que nos tempos de antanho se ia para os campos apanhar algo mais do que espigas, para celebrar o viço primaveril...

quarta-feira, 16 de maio de 2007

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Iluminando a matéria escura.

Leituras

Guardian | Bush doesn't want detente. He wants to attack Iran Para lá das notícias alarmantes sobre a bomba atómica dos mullahs, há uma história convenientemente esquecida de aberturas iranianas à comunidade internacional, depressa ignoradas por um governo americano que parece apostado em criar mais uma guerra no Médio Oriente. Alguns analistas afirmam que é a própria política americana em relação à capacidade nuclear iraniana que está a forçar o Irão a desenvolver armas atómicas.

Look, See: Chris Ashley Um blog que divulga os desenhos do seu autor, executados em html. Imagens que não são imagens, antes tabelas html geradas como forma de arte. Um trabalho verdadeiramente inovador. Via Rhizome.

Chris Jordan | Running the Numbers - An American Self Protrait Um trabalho fotográfico inovador, que dá corpo visual aos dados estatísticos do consumo. Uma forma brilhante de visualizar os números, a partir da colagem digital de inúmeras imagens. De cortar a respiração. Via Boing Boing

BBC | Hubble spots ring of dark matter O venerável telescópio orbital obteve imagens que revelam pistas que comprovam a existência de matéria escura, a quintessência da moderna astronomia. A importância da matéria escura para as teorias cosmológicas é enorme: sem os efeitos gravitacionais da matéria escura, não é possível explicar o equilíbrio gravitacional das galáxias.

BBC | Free tool offers 'easy' coding A linguagem Scratch, desenvolvida no MIT, promete simplificar a programação através de uma abordagem modular, manipulando código como os blocos Lego. O criador do Scratch foi o mesmo investigador do MIT responsável pelo Lego Mindstorms, a linguagem que facilitou o acesso à robótica. Adivinhem qual será a minha próxima obsessão (não, não é o html como utensílio de desenho). Depois da contaminação do espírito dos alunos com o vírus do 3D, tenho de testar o Scratch. Next best thing na noosfera. Scratch. Geralmente os tipos do MIT não brincam em serviço.

Moodle Uma poderosa ferramenta de e-learning, com o potencial de criar sites visualmente atrozes. Será o meu desafio nas férias dos alunos - domar esta "besta" e dotar a minha escola de um site moodle acessível e interactivo. Desafio, mas acompanhado, que este tipo de coisas exige trabalho colaborativo.

terça-feira, 15 de maio de 2007

Leituras

BBC | Web 2.0 distracts good design Esta nova iteração da internet, interactiva e colaborativa, está cheia de potencial e de grandes ideias. Infelizmente, o aspecto visual e a facilidade de utilização da web 2.0 fica muitas vezes esquecida por debaixo dos novos recursos tecnológicos. Se isto é verdade para sites insuspeitos, nalguns chega a ser gritante: já conhecem o Moodle, a nova forma que muitas escolas utilizam para se publicitarem na internet? A plataforma é poderosa, mas o aspecto visual é horrendo.

El Mundo | El imparable avance de Singapur, la isla creciente A minúscula cidade-estado de Singapura, estratégicamente situada na ponta da península malaia, tem ao longo de décadas alargado o seu território conquistando terras ao mar. Mas para Singapura crescer, as toneladas de areia têm de vir de algum lado... e já algumas ilhas indonésias estão em risco de desaparecer do mapa, com todas as suas areias exportadas para os novos territórios de Singapura.

The New York Times | Web fight: blocking ads and adding art O banner publicitário, tal como o popup e os intersticiais, tornaram-se omnipresentes na internet. São poucos os sites que resistem à infiltração publicitária, e embora se aceitem os anuncios como forma de financiar sites e manter gratuito o conteúdo dos mesmos (information wants to be free mas há muitas maneiras de fazer dinheiro com ela), por vezes não há paciência. Para combater os anuncios, surgiram os adblockers, programas que bloqueiam a visualização de anuncios. No caso deste retratado no artigo, com um toque interessante: substitui a mensagem publicitária por uma obra de arte. É um plugin para firefox, o que significa que os 95% dos internautas que ainda usam aquela peça de software inútil chamada internet explorer podem ficar seguros que o seu consumo publicitário não será interrompido por intrusivas e chocantes imagens artísticas.

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Vastidão silenciosa do vazio.

Mão invisível

Ontem vi-me na contingência de levar o meu velho carro à oficina, para a revisão que antecede a obrigatória inspecção anual ao veículo. É coisa boa; distraído como sou, se não fosse pelas inspecções só levaria o carro a uma oficina quando ele avariasse de vez...

Sem carro, ontem optei por utilizar os transportes públicos, com um olhinho a substituir a viagem diária até ao local de trabalho por um percurso em transportes públicos. Talvez poupe dinheiro, com o gasóleo cada vez mais alto, e certamente que faria melhor ao ambiente. Seria menos um carro nas estradas.

Uma análise aos horários das carreiras de autocarros depressa me fez esquecer essa ideia. De carro, com trânsito, o percurso entre a minha casa e o meu local de trabalho (entre a Ericeira e a Venda do Pinheiro) pode demorar no máximo quarenta minutos - e se demorar, é porque apanhei muito trânsito. De autocarro, estava previsto que demoraria cinquenta minutos, sem contar com o trânsito. Pior, à excepção das horas de ponta, a regularidade das carreiras mede-se de hora em hora. Mesmo assim, viver no eixo Ericeira-Mafra é bom para quem tem de recorrer aos transportes - quem vive nas outras localidades que tanto nos esquecemos que fazem parte deste concelho não tem sequer o luxo de poder contar com um autocarro de hora em hora. Pensem mais em dois ou três... por dia.

Entretanto, Mafra enche-se de asfalto. Enquanto aguardei na paragem de autocarros, observei a infinda procissão de automóveis. Grande parte deles poderia ter muito bem ficado estacionado, se os condutores recorressem aos transportes. Mas como, e para quê, se a rede de transportes públicos não oferece a versatilidade e a comodidade do veículo particular? Talvez se as redes de transportes fossem mais bem pensadas, bem implantadas, como autocarros com grande periodicidade a circular entre as localidades, mais automóveis poderiam ficar estacionados. Mas não é isso que acontece. A combinação entre a inércia, a estupidez e a cupidez dos poderes instituídos tem controbuído para o efectivo desmantelamento das redes de transportes públicos, em favorecimento de uma cada vez mais abrangente rede de estradas e auto-estradas destinada a servir um cada vez maior número de véiculos pessoais... que não estariam todos os dias nas estradas, se as redes de transportes fossem eficientes e bem geridas. Não é culpa do mercado. A mão invisível do mercado só age de acordo com os seus interesses. O que não dá lucro, não interessa. Agora, queremos mesmo subordinar tudo à lógica da eficiência baseada unicamente na rentabilidade?

Quem pode, tem carro. As nossas vilas e cidades modificam-se à volta do omnipresente veículo. Qualquer supermercado que se preze rodeia-se de um vasto parque de estacionamento. Se fica perto de uma paragem de autocarros ou estação de comboios é coisa que pouco interessa. A estrutura urbana que nos rodeia está pensada unicamente em função do automóvel. E quem não tem automóvel, perde assim o acesso pleno às estruturas urbanas. Mas também aqui a lógica de mercado se aplica. Quem não tem automóvel não o tem por ser muito jovem, por não ter condições financeiras ou por ser idoso. Grupos demográficos que não atraem investimentos. Não são rentáveis.

Convenhamos que por detrás da retórica ambiental que defende o conceito de transporte público movem-se enormes interesses financeiros. Não é uma mão gigantesca e invisível, é uma míriade de mãos de vários tamanhos, desde a do mecânico do bairro à da multinacional, cujos interesses estão na manutenção do paradigma do transporte automóvel pessoal. O transporte público não dá muito dinheiro. É preciso um investimento enorme em infraestruturas, rentabilizáveis apenas a muito longo prazo. Entretanto, cada automóvel é a fonte de um rio de dinheiros que alimenta indústrias, banca, serviços e impostos.

Nesta época em que vivemos as agruras de um ambiente cada vez mais danificado pela acção humana, urge investir em formas mais racionais de vida. No entanto, continua-se plantar asfalto. Dá que pensar, enquanto vemos o concelho de Mafra a dar passos decisivos para se transformar em mais uma zona IC19, alegremente e em nome de uma ideia retrógrada de progresso. As coisas têm mesmo que ser assim?

segunda-feira, 14 de maio de 2007

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Dez horas a renderizar. Dizem os entendidos que tal se deve ao material nébula, mas valeu a pena. Mesmo assim, não gosto da imagem. Está muito limpa. Está por isso na hora de arrancar o Photoshop e ver o que é que se consegue fazer dela.

Os Melhores Contos de Howard Phillips Lovecraft



H. P. Lovecraft, Os Melhores Contos de Howard Phillips Lovecraft - Volume II, Saída de Emergência, 2007

Saída de Emergência

Talvez o Edgar Allan Poe da literatura americana dos inícios do século XX, H. P. Lovecraft foi na sua vida um apagado mas influente escritor de horror e fantasia, essencialmente publicado nas revistas pulp da época, bem como em revistas amadoras dedicadas aos fãs do género. Após a sua morte, Lovecraft e a sua obra pareciam estar votados à obscuridade e ao esquecimento, algo que só não aconteceu devido aos tenazes esforços de alguns fãs dedicados que ao longo de décadas foram assegurando novas edições dos contos clássicos do autor, bem como o cuidados estudo dos acervos documentais relativos a Lovecraft. Pode-se dizer que foi um esforço compensador. Sem este esforço, Lovecraft teria certamente caído no esquecimento, o que seria uma perda tremenda. A obra de Lovecraft é talvez das mais marcantes no campo da ficção de terror, e influência óbvia para muitos escritores, artistas e cineastas que se dedicam a olhar para os mitos mais obscuros saídos da imaginação humana.

Uma óbvia comparação pode ser traçada entre Lovecraft e Bach, músico extremamente prolífico mas que após a sua morte caiu no esquecimento, tendo sido recuperada a memória da sua música através do paciente trabalho dos musicólogos... e que música, esse canto de anjos, notas que descrevem sinfonias e arabescos perfeitos, música mais bela do que a das esferas. Salvem-se as devidas distâncias para com o maior génio musical de todos os tempos, mas dentro do seu nicho literário Lovecraft foi um marco de génio. Da sua casa de Providence, na mais inglesa das américas, Lovecraft soube sentir o pulsar dos tempos e o ritmo das tradições, misturando na sua ficção o horror clássico, o medo do desconhecido, a estranheza da ciência e o poder dos mitos.

Durante décadas, Lovecraft foi autor desconhecido do grande público português, pérola literária conhecida apenas pelos conhecedores mais atentos, publicado apenas nas colectâneas e livros de bolso importados. Traduções para português eram quase nenhumas. Isso tem vindo a mudar, graças aos esforços da editora Saída de Emergência e de José Manuel Lopes, tradutor e professor na Universidade Lusófona. Em 2006 foi editado o primeiro volume de contos traduzidos, trabalho de tradução tutelado por José Manuel Lopes, e em 2007 o trabalho teve seguimento, com a publicação de um segundo volume de traduções dos contos de Lovecraft.

Neste segundo volume podemos ler, finalmente em português, os seguintes contos: O Templo, onde Lovecraft começou a esboçar os elementos que mais tarde viriam a tornar-se os Cthulhu Mythos; A Chave de Prata, Através dos Portais da Chave de Prata e O Depoimento de Randolph Carter, três contos interligados pelo seu profundo onirismo inspirado em Lord Dunsany onde Lovecrat revela um lado de poesia mais fantástica (expandida em The Dream-Quest of Unknown Kadath, obra onírica onde o fantástico assume uma preponderância surreal), misturando elementos embrionários dos Mythos; Factos Acerca do Falecido Arthur Jermyn e sua Família, conto clássico onde ciência e horror entram em colisão com as lendas sobre o que os exploradores encontraram nas profundezas da selva africana; A Gravura no Livro da Casa, conto de génio onde os ingredientes teneborosos do horror se conjugam numa narrativa de canibalismo e loucura; A Música de Erich Zann, obra onírica onde outras dimensões tocam fugazmente a nossa; Os Sonhos na Casa da Bruxa, onde a mestria de Lovecraft combina horror com geometria, ciência com as lendas da tradição de bruxaria da Nova Inglaterra num conto arrepiante; O clássico A Abominação de Dunwich, onde Lovecraft explora ao limite os ingredientes dos seus Mythos - obras obscuras onde se pode ler conhecimento secreto e perigoso, invocação e encantamentos de criaturas monstruosas de além-espaço; O Medo do Oculto, conto aterrorizante sobre o que se pode encontrar sob as colinas tenebrosas de uma região particularmente degenerada, esquecida no meio da Nova Inglaterra; e, para terminar, os elementos pulp clássicos - cemitérios, carácteres desonestos, noite, esqueletos e a obrigatória reviravolta final conjugados na pureza do ambiente de literatura pulp que é o conto A Casa Mortuária.

Aos conhecedores mais profundos da obra de Lovecraft esta edição não traz nada de novo, excepto a sua preciosíssima tradução em português, esforço que merece os maiores aplausos. Aqueles que já conhecem Lovecraft de trás para a frente terão sempre o prazer de finalmente lerem a prosa filiganada do autor em português. Para aqueles que conhecem pouco, que gostariam de conhecer mais, ou que não conhecem Lovecraft, esta obra, acompanhada do primeiro volume, é uma preciosa introdução que certamente não deixará de apaixonar o mais casual dos leitores pela prosa única e pelas visões tenebrosas de além-espaço saídas da pena deste autor único.

domingo, 13 de maio de 2007

Leituras

BBC | Google searches web's dark side Google Virus? A gigantesca capacidade de catalogação de sites do Google começa a ser utilizada na defesa contra o cibercrime. A análise feita ao conteúdo das páginas permite à Google identificar sites perigosos e ameaças informáticas. Por enquanto identifica, em breve poderá bloquear...

Guardian | Chinese hospital staff face attacks A China atreveu-se a ir até ao fim, tendo substituído o seu sistema de saúde público por um sistema privatizado de fazer inveja aos maiores sonhos dos economistas. A mão invisível do mercado funciona perfeitamente: os afluentes têm direito aos melhores tratamentos, os hospitais financiam-se prescrevendo medicamentos a torto e a direito, ou optando por tratamentos caros caso haja alternativa entre um tratamento caro e um barato, e à população mais empobrecida é recusado o tratamento médico. Quem não pode pagar não precisa de tratamentos...

Guardian | Untouchables sweep to power A Índia está a ressurgir como um país a observar. A coqueluche asiática dos analistas é a China, graças à pujança económica e visão única do mercado, mas a Índia, de forma mais interessante, está a propulsionar-se decisivamente em direcção ao século XXI. Note-se que ao contrário da China, estado autoritário onde a mera menção da palavra democracia granjeia pesadas penas de prisão, a Índia é a maior democracia do mundo - e como demonstra esta curiosa notícia do Guardian, é uma democracia estável, com igualdade de oportunidades demonstrada pela chegada ao poder num estado indiano de um partido constituído por intocáveis (a mais baixa do antigo e abolido sistema de castas indiano), embora coligados com o seu mais completo oposto, um partido de brâmanes (o topo do sistema de castas). Quando pensamos na Índia, pensamos num país vasto e populoso, ex-joia da coroa inglesa, num país de calor, fome, atraso. Pensamos na pobreza abjecta de Calcutá. Mas a Índia está a mudar. Bollywood, a indústria cinematográfica sediada em Bombaim, é já a maior produtora mundial de cinema. Bangalore é conhecida por ser o centro da Índia high tech, atractiva para inúmeras empresas estrangeiras que buscam a capacidade altíssimamente qualificada dos especialistas indianos. O país esforça-se por arrancar da pobreza milhões de habitantes, com programas económicos destinados a melhorar as condições de vida de milhões de camponeses. Os programas científicos e espaciais indianos apontam a lua como alvo, após o bem sucedido lançamento do seu primeiro foguetão comercial. O dinamismo indiano está presente em locais como Sillicon Valley, onde grande parte das empresas-chave da nova economia foram fundadas por indianos (um exemplo: o Hotmail). E já mencionei que é uma democracia, coisa rara pelas partidas da ásia?

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Dia 13. Hoje Portugal mergulha profundamente na celebração da histeria, da alucinação, do medievo e da hipocrisia enquanto comemora uma efeméride relacionada com essa doença mental pelos vistos impossível de erradicar que é a religião. A humanidade ainda tem muito que evoluir. Rodeados de complexos sistemas, detentores de conhecimentos abrangentes e criadores de tecnologias quase mágicas, ainda pensamos como os velhos neadertais que na escuridão da noite dos tempos, na era primitiva que nos deu origem, teciam velhos e esquecidos mitos para combaterem o medo do grande mundo desconhecido que os fascinava, intrigava e devorava. Os milhares de anos esbateram essas mitologias, mas o seu gérmen mantém-se nas teologias e mitologias que ainda hoje manipulam milhões de descendentes dos velhos neandertais (e sapiens, claro) que vasculhavam o vasto mundo pré-histórico.

A imagem tem tudo a ver com isto: olhemos para cima, olhemos para as estrelas com o poder da nossa tecnologia e a ferramenta da nossa aguçada inteligência, com esperança que tenhamos a sabedoria necessária para ultrapassar as grilhetas do poço de gravidade - e ultrapassar as grilhetas das tradições advindas da noite dos tempos (expressão arcaica para a pré-história, que eu adoro), rumo ao futuro.

sábado, 12 de maio de 2007

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Por enquanto é só. A semana foi pesada e estou literalmente estoirado. Ainda bem; é sinal que gastei o tempo de forma produtiva. Ainda bem que penso assim - é sinal que me sinto recompensado pelo meu labor, algo raro nos tempos que passam, especialmente na minha profissão.

Fim de semana. Tempo para contemplar os Pequenos Artistas e ler a NOVA, agora também em versão pdf.

sexta-feira, 11 de maio de 2007

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Rapidinha na sala de aula (isto desta maneira não soa muito bem) para ensinar mais uns truques aos alunos. Objectivo: conquistar e mostrar o que é possível. Fighting mood, gentlmeman.

quinta-feira, 10 de maio de 2007

Jargonwatch

Logjunkie - aplicável aos que observam obsessivamente os logs de acesso aos seus sites, blogs ou páginas. Aplicável aos fãs irredimíveis do google analytics ou dos contadores que não resistem a clicar para ver quem lá foi ter e como. Ocorrido numa reunião em que dois responsáveis por uma rede de servidores educativa discorriam sobre o interesse da análise profunda às estatísticas de acesso aos sites (moodle, no caso). Ainda pensei em logporn, mas logjunkie define melhor este vício.

Economia aberta

Pensamento rápido: como seria uma economia open source? Isto saiu em lampejo de conversa entre colegas, em que mais uma vez sublinhávamos o software open source como a já next best thing, com o software remoto já na linha do horizonte.

Há professores que conversam sobre outras coisas além do estado de decadência geral dos alunos.

Ideia relampejante: quais serão as consequências a longo prazo do open source? Recorde-se que o open source é uma ideia contraditória - lucrar a partir do gratuito. O software é criado e licenciado gratuitamente, por legiões de colaboradores que vão desde o indivíduo a empresas. A distribuição é gratuita. Então, como é que se pode lucrar, ter um modo de vida, a partir do trabalho gratuito? A resposta está no apoio técnico. Nenhuma solução é poção mágica, aplicável a todos os contextos. O apoio técnico é sempre necessário, por muitos gurus existentes nas organizações que utilizam este software. É um modelo de negócio que mostra resultados.

A questão que coloco é esta: será possível imaginar toda a economia a funcionar desta forma? Seria possível conceber o fim da venda de bens, sendo estes distribuídos gratuitamente em troca de contratos de manutenção? Fique com o carro de graça, embora tenha de se fidelizar à nossa empresa durante x tempo para a manutenção regular. Será o futuro?

Agora deixo no ar o desafio àqueles que realmente percebem disto. Será possível, desejável, previsível, inevitável, impossível um mundo open source?

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Cuidado, dentes afiados.

Leituras

BBC | UN warns on impacts of biofuels Os biocombustíveis prometem ser uma excelente forma de combater a dependência do petróleo e as emissões de C02 se... para plantar colheitas de plantas para utilização como combustível não se arrasem mais florestas, ou se deixem populações em risco de fome porque é mais lucrativo fazer crescer cana de açucar para etanol do que milho para dar de comer aos habitantes das regiões mais desfavorecidas do planeta.

Guardian | Don't be fooled by Europe's mood. Globally, the left is awakening Haverá futuro para a esquerda, perguntamo-nos após a vitória de Sarkozy em França, e com um governo nominalmente de socialista de esquerda em Portugal a seguir o exemplo do Labour de Tony Blair (com um fim triste, caro Sócrates, atente bem), com a Europa e o mundo a serem varridas por ondas conservadoras? Talvez... quando até Sarkozy pede cautela com a globalização, quando os candidatos à presidência americana falam abertamente das desigualdades sociais.

SIC | Portugal vai controlar espaço aéreo no Báltico Os estados bálticos não ficaram com nenhum dos recursos aeronáticos russos após a sua independência, o que significa que não têm força aérea. A NATO assegura o patrulhamento do espaço aéreo destes estados, através de missões de rotação, e chegou a vez de Portugal com os seus F-16, as aeronaves mais high-tech do nosso arsenal. No entanto, quem viu a reportagem no telejornal da SIC foi brindado com belíssimas imagens de Mirages franceses...

quarta-feira, 9 de maio de 2007

Resmungo

Vou ser chatinho: já visitaram os Pequenos Artistas? Desculpem a insistência, mas passei a tarde numa reunião de projectos TIC e a reunião foi iniciada com uma apresentação do projecto Artist@s digitais. Claro que irei inscrever os meus alunos. Mas calei-me, encolhi-me na cadeira e não divulguei o endereço da página dos meus alunos... porque os formadores, de largo sorriso aberto, mostravam isto como exemplo dos trabalhos publicados. Trabalhos em MS Paint. Paint? Ah, mentes tacanhas dos meus colegas, que se julgam pós-modernos por colocarem os miúdos à frente do computador e deixá-los desenhar nessa epítome do software de desenho que é o Paint. Enfim, não é que o Paint seja de todo inutil: se se pesquisar o Deviant Art descobre-se que o Paint permite fazer coisas como estas ou estas.

Ser professor moderno, conhecedor de novas tecnologias, significa muito mais do que fazer chover computadores na sala de aula. É preciso saber pensar. E para isso é preciso ultrapassar a tacanhice medíocre da teoria pedagógica, que tem sido o grande travão à evolução do ensino em portugal. Basta estar de olhos muito bem abertos.

Estas palavras são uma heresia? São, se se acreditar piamente na filosofia por detrás da formação de professores que, por exemplo, me formou a mim (e a todos os professores da minha geração) com uma mais do que sólida formação psicopedagógica, com enorme ênfase na teoria pedagógica e psicológia, e... uma nula formação científica na àrea de ensino. A teoria postula apenas que se ensine a ensinar, não que se ensine o que ensinar.

(Pronto. Resmungo feito. Momento de grande convencimento pessoal. Já passou.)

Leituras

BBC | Galileo system in a deep crisis Lançado com grande fanfarra, a constelação de satélites Galileu era supostamente a grande resposta europeia ao domínio americano do GPS. Mas as datas cruciais aproximam-se e as famosas parcerias com investidores privados a não se estabelecerem, o projecto corre o risco de ser deixado morrer.

El Mundo | Un fin de semana en un barrio de chabolas en sudáfrica, una nueva forma de "turismo social" A estética do esgoto. O resort nas barracas. As férias de sonho, no ghetto. A hipocrisia levada ao extremo, por turistas afluentes em busca de sensações fortes de ecoturismo.

Guardian | Waste and the flesh run A mão invisível do mercado, no seu melhor: no Reino Unido, a exploração intensiva das vacas leiteiras deu origem a um novo desperdício industrial: bezerros cuja carne não é considerada de qualidade suficiente para consumo humano, e que por não terem qualquer utilidade para os criadores são eliminados à nascensa.

The New York Times | Top chef dreams crushed by student loan debt Mais uma vez, a mão invisível do mercado no seu melhor e na grande terra do mercado. As escolas de culinária privadas atraem jovens esperançados num glorioso futuro como bem pagos cozinheiros em estabelecimentos de cinco estrelas. Endividam-se até à medula, apostando num futuro radioso, e quando terminam o curso... espera-os um emprego a virar hamburgueres, que não paga o suficiente para conseguirem cobrir as prestações do empréstimo. Mirabolante? Em Portugal fala-se sériamente na formalização dos empréstimos aos estudantes, em alternativa ao ensino universitário universal.

...



Combinação entre CBModel e Bryce. Tempus fugit...

Supernova

NOVA E-zine
Download do e-zine NOVA
Microsoft Reader

Do esforço editorial de Ricardo Loureiro saiu o e-zine NOVA, uma publicação electrónica que reúne o esforço literário de autores consagrados e de novos autores nos domínios da fantasia e ficção científica. Algo está a mexer em Portugal nestes campos, e sintomas desses movimentos estão na profusão de blogs dedicados ao tema que vincaram um espaço na blogoesfera (as minhas leituras obrigatórias diárias), na organização do Fórum Fantástico, já na segunda edição, e na actividade editorial de editoras como a Saída de Emergência, que se dedicam expressamente a campos literários alternativos.

Como fã emperdenido destes géneros, tenho de dizer a plenos pulmões: já não era sem tempo. A FC e fantasia estão a ganhar massa crítica, e a sua divulgação ultrapassa já os estreitos circuitos restritos aos fãs do género. Os autores clássicos são revisitados, e os novos autores divulgados. A FC e fantasia em língua portuguesa começam a ser publicadas de forma mais regular, começamo-nos a habituar a ver obras destes géneros nos escaparates das livrarias, com algum destaque, em vez de esquecidas nas prateleiras do fundo. É certo que a pujança não se aproxima dos níveis de outros países, mas para o país em que vivemos, isto é quase uma revolução.

Pergunto-me se este ressurgimento da FC seria possível sem as comunidadades virtuais. Pessoalmente, tenho as minhas dúvidas de que sem comunidades virtuais, sem pontos de convergência online dos fãs do género, a FC e fantasia surgissem com tanta força. Também podemos sempre considerar que após décadas (ou centénios) de adiamentos Portugal parece estar finalmente a viver o futuro.

Isto torna iniciativas como a NOVA ainda mais apreciáveis. A NOVA vem de baixo, vem da comunidade de fãs, que, dinamizada e organizada, produziu algo de novo e apreciável. A NOVA contém ficção, contos de João Ventura, Sara Guerreiro, Telmo Marçal, ensaio de Cynthia Ward sobre essa aparente raridade que é a FC no feminino, e resenhas sobre obras do género recém-publicadas (humildemente confesso que duas são da minha autoria).

Tempo de colocar travão aos rodeios. A NOVA é boa leitura, valiosa para os empedernidos fãs do género e também boa leitura para os neófitos dispostos a arriscar novas leituras. Verdadeiramente de parabéns está Ricardo Loureiro, o editor - sem o seu esforço e dedicação, a NOVA não existiria.

A NOVA está disponível para download em formato .lit a partir deste site: NOVA E-zine. Para ler o ficheiro é necessário ter instalado no computador o Microsoft Reader, disponível no site da microsoft.

terça-feira, 8 de maio de 2007

Leituras

El Mundo | El 8% de los trabajadores europeos vive bajo el umbral de la pobreza Particularmente preocupante é o reconhecimento de que ter emprego, nos tempos que correm, não é necessáriamente ter condições para viver acima do limiar da pobreza. É mesmo este o legado que queremos deixar às gerações futuras?

Guardian | The dope on advertising Irritante, fascinante, incoerente, cativante, aberrante. A publicidade já faz parte da tessitura do nosso mundo de ideias. Aconselha-se, no entanto, a não levar muito a sério todos os truques e alertas cativantes irremediávelmente difundidos de todas as formas possíveis, sob pena de completa dissolução neuronal.

The New York Times | Beam it down from the web, Scotty Até agora as impressoras tridimensionais - rapid prototyping machines - eram um caríssimo exclusivo das grandes empresas de tecnologia, que as utilizam para criarem protótipos rápidos. Mas os preços estão a descer, estando já o nível do aceitável para pequenas e médias empresas, ou até mesmo para centros de cópia. A perspectiva é a de maiores descidas, apoiadas em tecnologia mais eficiente - o que significa que dentro de alguns anos o mandar imprimir não significará a mera impressão de uma folha (já de si algo de milagroso, para quem conhece a história da prensa e da tipografia), mas sim a impressão tridimensional de um objecto.

E agora um resmungo.

Certamente que a abertura do supermercado Minipreço aqui na Ericeira despertou justificados receios de aniquilação do comércio tradicional. Meses passados após a loucura da novidade nos primeiros dias, parece que os receios são infundados. Ir fazer compras ao minipreço é um exercício de curiosidade mórbida, aguçada pela visão de inúmeras prateleiras despojadas de produtos, ou ocupadas por caixas vazias. Talvez seja uma forma de combate ao desperdício - as prateleiras só voltarão a ser enchidas quando tudo estiver vendido. Ainda bem para o comércio tradicional, que é local e atento às necessidades dos seus consumidores, e não se alicerça na dicotomia salários baixos para os funcionários/imposição de baixos custos aos produtores para gerar volume de negócios.

Boing Boing | Alter Ego: portraits of gamers and their avatars Um livro/projecto fotográfico, que se centra na realidade por detrás dos avatares online. Este avatar é particularmente simbólico do admirável mundo novo em que vivemos.

Não resisto a citar este brilhante diálogo:“Hey, you work in comics. Have you seen SPIDER-MAN 3 yet?”
“Hell, I haven’t seen SPIDER-MAN 2 yet.”
“But… you work in comics.”
“You work in a supermarket. Have you tasted that new brand of dogfood I saw advertised on the tv the other day? No? Then fuck off.”

Genial, direitinho do teclado do guru Warren Ellis.

Já visitaram os Pequenos Artistas?

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A "coisa" foi modelada no CB Model, multiplicada e renderizada no Bryce. Andava a precisar de umas abstracções. O trabalho realista requer um nível de atenção que toca as raias do autismo. A abstracção liberta-nos o espírito.

Pequenos Artistas

Pequenos Artistas

É o clássico problema do professor de E.V.T.: como expôr os trabalhos dos seus alunos? Normalmente, aguarda-se até ao final do ano para se realizar a exposição anual de trabalhos, momento de escolhas difíceis que acaba sempre por se traduzir em exposições algo atravancadas onde os trabalhos individuais acabam por se perder. Este ano, no meu caso, ainda se coloca outro problema: que fazer aos megabytes de ficheiros de imagem digital produzidos pelos meus alunos? Imprimo aquilo tudo, com um gasto considerável de tinta e papel?

Há outra solução, pela qual optei, uma solução de permanência que se mantém ao longo do ano lectivo: criar um local na internet onde os trabalhos estejam sempre em exposição. Mas isso coloca outro problema: como assegurar visibilidade aos trabalhos? O site da minha escola está em baixo (há uma solução no ar mas ainda há muito trabalho pela frente antes de a implementar). Blogs e páginas web padecem do síndrome um num bilião. A visibilidade é nula.

Tenho tido algum sucesso com a minha galeria do Deviant Art. Em menos de um ano conseguiu bastantes favoritos, comentários e observadores. Não posso dizer que tenha sido um sucesso estrondoso, mas o simples facto de saber que já não estou a criar para a gaveta, que posso mostrar aquilo que faço e receber feedback sobre o trabalho é algo de muito valioso. Já viciei a minha talentosa colega de trabalho no DA - já criou a sua galeria e sempre que pode é vê-la a publicar. Porque não transmitir a experiência aos meus alunos?

Foi esta a lógica por detrás da criação dos Pequenos Artistas, a galeria no Deviant Art que vai recolher os meus alunos. Já lá estão trabalhos publicados, infelizmente sem identificação, para proteger a necessária confidencialidade das crianças. Vão lá ver. A galeria reúne desenhos em suporte digital, criados utilizando as fieis ferramentas Inkscape, Bryce, DoGA e Art Rage (não consigo dar a volta ao Gimp, por mais que tente). Há também técnicas mais tradicionais, como a pintura sobre azulejo, fantoches e desenhos em suporte tradicional. Tenham em mente que são trabalhos de crianças, alunos de 6º ano.

Pequenos artistas no DA. Tem os seus riscos - o DA é um site aberto a muitas formas de expressão artística, mas não é nada que abertura de ideias e gestão cuidada não resolvam. Também é essa uma das funções pedagógicas do professor - fazer reflectir, fazer amadurecer o espírito dos alunos.

Tem sido este o meu trabalho. Ensinar crianças a exprimirem as suas ideias através da manipulação de inúmeros materiais, das tintas aos pixeis. Talvez ganhasse mais noutro tipo de profissão, a fazer precisamente aquilo que mais gosto, desenhar. Mas sendo professor, consigo chegar exuasto ao fim de um dia e mesmo assim sentir que o meu trabalho contribuiu para tornar o mundo um sítio um bocadinho melhor. Não há dinheiro que pague essa sensação.

(Por outro lado, eu sempre poderia ser menos complicado e limitar-me a anunciar os Pequenos Artistas no Deviant Art.)

segunda-feira, 7 de maio de 2007

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O meu àrduo trabalho num projecto ao longo deste fim-de-semana não me deixou tempo para os cinquenta mil novos desenhos que executo sempre que o tempo me permite. Resta-me ir publicando coias mais antigas. Como esta caverna, que durante alguns minutos foi confundida com uma gruta real. Fiquei lisonjeado.

The Djinn's Wife

Ian McDonald | The Djinn's Wife

A FC deslumbra os seus leitores e admiradores com descrições apaixonadas de cenários futuristas e exóticos, que no seu melhor estão para além da nossa imaginação. E inspiram fortemente a imaginação daqueles que tentam dar imagem tangível às visões literárias. Apesar disso, paradoxalmente, podemos acusar a FC de uma certa falta de diversidade cultural. As visões sociais da FC ou são perfeitamente alienígenas, ou são extrapolações da nossa sociedade ocidental, dos nossos mitos, das nossas formas de vida, da nossa crença na bem-aventurança tecnológica. Exemplo máximo está na obra de Arthur C. Clarke, que visualiza futuros onde as sociedades evoluem de forma científica, regrada e lógica. Elementos de outras culturas humanas são muitas vezes parte do cenário, um floreado em muitos casos decorativo, ou então aproximações ocidentalizadas a outras realidades culturais. Estou a pensar nos Maurai de Poul Anderson, visão exótica dos nativos dos mares do sul aplicada a um mundo pós-apocalíptico em que o ocidente se aniquilou numa guerra nuclear, ou nas visões condicionadas pela cultura pop do Japão de William Gibson.

Não estou aqui a fazer o papel de polícia cultural, balançando o casse-tête enquanto pergunto "então, meus senhores, onde é que está esse multiculturalismo, onde é que é dada a devida atenção às minorias étnicas". Também não vou defender aplicações de quotas políticamente correctas de igualdade literária. Os campos de expressão devem ser livres, e um escritor deve escrever aquilho que lhe der na real gana. Geralmente, as obras que respeitam ideários políticamente correctos (ou políticamente incorrectos) em detrimento da liberdade criativa, aplicada em nome de igualdades ou representatividades, são sempre umas coisas sensaboronas. Liberdade criativa significa precisamente isso, liberdade, e é esse o mais valioso aspecto das artes, sejam elas quais forem - a capacidade de nos fazer voar e sonhar, de abrir o caminho para a nossa mente ir mais além, transcendendo limites.

Tudo isto a propósito deste conto de Ian McDonald, nomeado para os prémios Hugo deste ano. The Djinn's Wife é um raro vislumbre de outras realidades futuristas cuja cultura não é a clássica cultura ocidental. Neste conto, Ian McDonald mergulha literalmente na Índia, e leva-a ao futuro, não nos nossos termos, mas nos termos culturais indianos.

O mote de The Djinn's Wife é uma história de amor, entre uma bailarina tradicional indiana e um génio, um daqueles génios que se manifestam como se saídos das lâmpadas das mil e uma noites. Mas pouco há de visão orientalista dos mistérios exóticos do longínquo oriente neste conto. A Índia é uma Índia futura, tão complexa e incoerente como a Índia moderna - a maior democracia do mundo, corroída por intensas desigualdades, mas cuja democracia, incrívelmente, funciona, um país onde milhões ainda vivem em profunda pobreza onde ao mesmo tempo os seus cientistas são capazes de planear missões lunares e que se afirma no mundo da alta tecnologia, onde os esforços científicos nos domínios da astronáutica não são programas de prestígio destinados a propagandear as boas obras do regime instalado no poder (como no caso do programa espacial chinês, caso clássico de propaganda) mas sim esforços genuínos no sentido de moldar um país moderno e desenvolvido a partir das capacidades e tradições do sub-continente.

Ian McDonald projecta a Índia moderna num futuro próximo, num futuro onde a União Indiana colapsou em vários estados que jogam entre si perigosos jogos geopolíticos para dominar os escassos recursos naturais. The Djinn's Wife tem uma poderosa textura alicerçada numa sociedade contraditória, onde tradições milenares e alta tecnologia coexistem com obsessões com a cultura pop, manobras políticas e costumes arreigados na memória. A história de amor entre a bailarina, exímia numa das mais antigas e tradicionais artes indianas, e o génio do conto, sublinha esse contraste entre tradição/modernidade que está no âmago da contemporâniedade das sociedades não ocidentais do planeta. O génio desta história não é um espírito enclausurado numa garrafa, ou numa lâmpada mágica, mas sim uma Inteligência Artificial avançada, quase indistinguível da inteligência humana, excepto pelo seu carácter incórporeo.

A história de amor não tem um final feliz, nesta história onde dois estados indianos estão à beira de uma guerra pelo controle das àguas do rio Ganges, onde as Nações Unidas aprovam leis que visam limitar o desenvolvimento das inteligências artificiais temendo ameaças à humanidade, e onde as velhas tradições se continuam a mostrar arreigadas.

Ian McDonald está a ganhar reputação como um autor de FC capaz de misturar as tradições de outras culturas com as premissas da FC em cokctails vibrantes e poderosos. Depois deste conto, a curiosidade ficou aguçada para o romance River of Gods, em ambiente indiano, e para o recém publicado Brasyl, onde o nosso país irmão é projectado no futuro.

The Djinn's Wife está disponível online no site da Asimov SF.